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CLÓVIS ROSSI
O medo venceu a alegria
SÃO PAULO - Fiquei com uma dúvida, que compartilho com o leitor,
a propósito do belo texto de Tostão
ontem publicado por esta Folha.
Diz ele que "mesmo as pessoas de
bem se acostumam com tudo isso",
sendo "tudo isso", se Tostão me
permite um resumo apertado, a
violência dentro e fora dos estádios,
a falta de cidadania, a corrupção, a
impunidade, "a prática disseminada do jeitinho brasileiro".
Minha dúvida é simples: as pessoas acostumam-se ou sentem-se
absolutamente impotentes diante
de "tudo isso"?
Fiquemos no território da violência nos estádios. Está em discussão o veto ao que é uma das maiores
graças do futebol, a possibilidade
de gozar o torcedor adversário (sou
pré-antigo, do tempo em que havia
apenas adversários, não inimigos
como hoje).
Refiro-me à ideia de limitar a
apenas 5% a venda de ingressos aos
torcedores do time que não é mandante da partida. Se é que não se vai
chegar à proibição total da presença de mais de uma torcida no mesmo estádio.
Significa o seguinte: desistimos
de conviver com o "outro". É preciso bani-lo, como fazem vários países com os imigrantes ilegais.
Aqui, ilegais somos nós mesmos,
se torcemos para o Corinthians e
jogamos no Morumbi ou se torcemos para o São Paulo e jogamos no
Parque Antártica.
Ouvi no domingo, no "Bate Bola"
da ESPN Brasil, Juca Kfouri dizer
que desistira de levar o filho mais
novo aos estádios devido ao risco
implícito (ou explícito) que há nessa atividade antes trivial, contrariando prática que adotara com os
mais velhos, no que era um exercício de troca de afetos.
Juca renunciou não só à alegria
-um direito fundamental- mas a
uma fatia da paternidade.
Conformou-se, como diz Tostão,
ou se sente impotente para mudar
alguma coisa do "tudo isso" que revolta Tostão e tantos outros?
crossi@uol.com.br
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