São Paulo, sábado, 19 de março de 2011

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Impasse na Líbia

Resolução leva Gaddafi a pelo menos prometer cessar-fogo no massacre a rebeldes; ainda é incerto, todavia, resultado de uma intervenção ocidental

A resolução 1.973 do Conselho de Segurança das Nações Unidas teve, ao menos no primeiro momento, um efeito positivo sobre a situação líbia. A imposição de uma zona de exclusão aérea -e a consequente ameaça de bombardeio- levou o coronel Muammar Gaddafi a declarar "cessar-fogo".
O anúncio do ditador representa, ao menos na retórica, uma mudança radical em relação à sua disposição no dia anterior. Quando ainda não lhe pairava sobre a cabeça o poderio militar do Ocidente, Gaddafi havia prometido limpar a capital rebelde de Benghazi "casa por casa, quarto por quarto", "sem dó nem piedade".
Ainda é cedo, no entanto, para captar os desdobramentos mais profundos da promessa de intervenção militar das Nações Unidas. Declarações de ditadores são, por hábito, pouco confiáveis, e a situação em terra é volátil.
As potências do Ocidente ainda debatem a iminência e a força do ataque. Reino Unido e França, defensores de uma intervenção desde o início da crise, têm sido bastante enfáticos. Um porta-voz francês chegou a dizer que o objetivo é "deixar o povo líbio ir até o fim, o que significa derrubar o regime de Gaddafi".
Os Estados Unidos também pregaram a deposição do ditador. Mais contundente que o próprio presidente Barack Obama, a secretária de Estado, Hillary Clinton, afirmou ontem que vai "pressionar Gaddafi a sair e apoiar as legítimas aspirações do povo líbio".
A resolução que levou a situação a esse ponto teve o apoio até da Liga Árabe, o que dá mostra do consenso de repúdio aos ataques ferozes da ditadura líbia. O efetivo militar do país vinha sendo usado para massacrar os rebeldes, em um quadro com contornos de uma desigual guerra civil.
As manifestações das potências ocidentais, no entanto, parecem ir além do que autoriza a resolução aprovada pela ONU. O objetivo do texto era claramente proteger civis, não uma mudança de regime.
Nesse contexto, a decisão do Brasil de se abster na votação do conselho foi correta. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, condenou a abrangência da resolução. Embora desautorize invasão terrestre, ela deixaria brechas para bombardeios com vistas à destituição de Gaddafi.
A soberania é o conceito fundamental das relações entre nações, e o princípio da não intervenção só deveria ser ultrapassado em situações de violação contínua e maciça dos direitos humanos.
Mesmo que tendesse nessa direção, o cenário líbio ainda deixava, ontem, margem para dúvidas legítimas. O fato de uma ditadura lançar ofensiva impiedosa contra a massa de rebeldes não altera a realidade mais ampla de que se trata, sobretudo, de um confronto entre líbios.
A resolução da ONU produziu frutos ainda frágeis. Nesse novo cenário, o Brasil deve endossar esforços, no âmbito da comunidade internacional, em prol de uma solução pacífica e duradoura.


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