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CARLOS HEITOR CONY
Um saco!
RIO DE JANEIRO - Teve seus dias de glória, de glória muita e merecida.
Nada se fazia sem antes consultá-lo,
pois sabia tudo, tudo previa e nada
lhe era indiferente.
O último poema do Mário Faustino, a nova instalação do Hélio Oiticica, o menisco de Garrincha, a cotação do último Mondrian na galeria
Tate, os rumos radicais da Tricontinental realizada pelos dissidentes de
Moscou, a melhor trilha para um safári no Congo, as possibilidades de
um certo cardeal toscano em suceder
o papa, que estava alquebrado, não
havia assunto de que ele não entendesse e sobre o qual não desse a palavra definitiva, final e fatal.
Era modesto, aparecia pouco na
mídia, eram poucos os eleitos que tinham acesso a seu telefone e raríssimos os que o frequentavam pessoalmente. Numa enquete sobre as personalidades mais influentes dos anos
50 e 60, o nome dele apareceu com
destaque. Era o único brasileiro que
tinha a fama de ser amigo do Frank
Sinatra. E, quando fazia anos, o bicheiro Castor de Andrade levava a
bateria da Mocidade de Padre Miguel para animar a festa que ele nunca dava, mesmo assim havia festa,
pois ele em si era uma festa.
Pensei que houvesse morrido -o
que seria da vida. Outro dia o vi na
TV. Eu esperava um jogo da Copa do
Mundo numa dessas madrugadas, a
programação era requentada, de repente ele me apareceu sendo entrevistado como nos velhos tempos.
A todas as perguntas respondia invariavelmente: um saco! Chapa José
Serra-Rita Camata -um saco! Lula
prometendo ser bonzinho com o mercado -um saco! Felipão mudando a
defesa para enfrentar as oitavas-de-final -um saco! Até mesmo a morte
do Tim Lopes, que tanto comoveu a
tantos, era um saco para ele.
Desliguei a TV. Para que ver a Alemanha contra o Paraguai? Ou pior, a
Turquia contra o Japão? Um saco!
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