São Paulo, quarta-feira, 19 de junho de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

Um saco!

RIO DE JANEIRO - Teve seus dias de glória, de glória muita e merecida. Nada se fazia sem antes consultá-lo, pois sabia tudo, tudo previa e nada lhe era indiferente.
O último poema do Mário Faustino, a nova instalação do Hélio Oiticica, o menisco de Garrincha, a cotação do último Mondrian na galeria Tate, os rumos radicais da Tricontinental realizada pelos dissidentes de Moscou, a melhor trilha para um safári no Congo, as possibilidades de um certo cardeal toscano em suceder o papa, que estava alquebrado, não havia assunto de que ele não entendesse e sobre o qual não desse a palavra definitiva, final e fatal.
Era modesto, aparecia pouco na mídia, eram poucos os eleitos que tinham acesso a seu telefone e raríssimos os que o frequentavam pessoalmente. Numa enquete sobre as personalidades mais influentes dos anos 50 e 60, o nome dele apareceu com destaque. Era o único brasileiro que tinha a fama de ser amigo do Frank Sinatra. E, quando fazia anos, o bicheiro Castor de Andrade levava a bateria da Mocidade de Padre Miguel para animar a festa que ele nunca dava, mesmo assim havia festa, pois ele em si era uma festa.
Pensei que houvesse morrido -o que seria da vida. Outro dia o vi na TV. Eu esperava um jogo da Copa do Mundo numa dessas madrugadas, a programação era requentada, de repente ele me apareceu sendo entrevistado como nos velhos tempos.
A todas as perguntas respondia invariavelmente: um saco! Chapa José Serra-Rita Camata -um saco! Lula prometendo ser bonzinho com o mercado -um saco! Felipão mudando a defesa para enfrentar as oitavas-de-final -um saco! Até mesmo a morte do Tim Lopes, que tanto comoveu a tantos, era um saco para ele.
Desliguei a TV. Para que ver a Alemanha contra o Paraguai? Ou pior, a Turquia contra o Japão? Um saco!


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