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CLÓVIS ROSSI
É proibido silenciar
SÃO PAULO - Uma vez, anos atrás,
um acadêmico norte-americano especializado em América Latina (o
nome se perdeu nas brumas da memória) comentou comigo que a palavra "accountability" não tem tradução fiel, precisa, nem em português nem em espanhol.
O sentido mais próximo é "prestação de contas". Mas não alcança o
mais profundo do conceito, que é o
de introjetar a obrigação de render
contas de seus atos, especialmente
se se é agente público.
Posto de outra forma: o funcionário público, de qualquer calibre,
tem marcada na alma a certeza de
que deve explicações ao público,
mesmo quando o público não as esteja pedindo.
É essa consciência, indispensável
à construção da República, que o
senador José Sarney demonstra
não possuir, ao recorrer a uma frase
de Sêneca para calar-se. Essa história de combater o que chama de "injustiça" com "o silêncio, a paciência
e o tempo" não passa de fuga às suas
responsabilidades e de traição ao
conceito de "accountability" que
ele, como funcionário público da
mais alta graduação, deveria ser o
primeiro a defender.
De quebra, Sarney refugia-se na
velhíssima e fajutíssima tese de
perseguição da mídia. Não, senador, é perseguição dos fatos, e enquanto eles não forem total e definitivamente explicados, continuarão a persegui-lo, no Maranhão, em
Brasília, onde for.
É essa fuga à "accountability" que
explica os parlamentares que se lixam para a opinião pública. Ela paga os salários de todo esse "band of
brothers", mas eles não se sentem
compelidos a dizer ao púbico o que
fazem, o que só aumenta a suspeita
de que o que fazem só cabe mesmo
em BOs.
O caso de Sarney é mais grave
porque tem um espaço semanal,
aqui ao lado, em que poderia dar todas as explicações sem ser interrompido por perguntas. Prefere
mudar de assunto. Sempre.
crossi@uol.com.br
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