|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
BORIS FAUSTO
Democracia e consenso
Não é segredo para ninguém
que, nos últimos meses, o Brasil
vem atravessando uma grave crise.
Em conjunturas desse gênero, cujos
riscos são evidentes, aparecem ao
mesmo tempo oportunidades que
não costumam surgir em situações
normais.
O presidente Fernando Henrique
soube perceber esse fato. A partir daí,
ele tem desenvolvido uma atuação
muito significativa no sentido de preservar e de reforçar as instituições democráticas, uma das marcas aliás de
seu governo. A tarefa não é simples, na
medida em que passa pela necessidade de demarcar limites entre um presidente que tem um candidato de seu
partido à sucessão presidencial e um
estadista que deve falar e agir em nome do interesse nacional.
Ao longo de mais de um século de
regime republicano, só agora a plena
consolidação da democracia tem possibilidades de realizar-se. Nunca é demais repetir que, para tanto, é necessária a formação de um consenso básico entre as principais correntes políticas como base fundamental que não
elimina, mas, pelo contrário, dá solidez ao confronto de opiniões divergentes.
De fato, a história da República tem
sido marcada pela vigência inicial de
um regime oligárquico e pelos longos
regimes autoritários -sob a chefia de
Getúlio Vargas e, depois, as dos generais-presidentes-, assim como pelas
incertezas das fases democráticas
A forma pela qual se deram as sucessões presidenciais é reveladora da
míngua de convicções democráticas e
do personalismo na história de nosso
país. São muitos os exemplos. Jânio
Quadros tomou posse em Brasília não
sem antes lançar raios e trovões sobre
a cabeça do presidente Juscelino, acusando-o de corrupto e prometendo fazer uma devassa geral em seu governo. Outra coisa não fez Collor em relação ao presidente Sarney, a cuja posse
o general Figueiredo nem sequer
compareceu. Essa atitude teve um antecedente histórico -o do também
general Floriano Peixoto. Este, nos
idos de 1894, segundo consta, ficou em
casa, cuidando das rosas de seu jardim
e recusando-se a dar posse a Prudente
de Moraes, contrariado pelo triunfo
da "república dos fazendeiros".
É nesse contexto que ganha maior
relevo a iniciativa do presidente Fernando Henrique, acertando um encontro com os presidenciáveis, entre
os quais há três candidatos da oposição. O objetivo principal, como se sabe, é o de discutir com eles as questões
centrais do país e, em particular, os recentes acordos internacionais destinados a enfrentar a crise.
As dúvidas acerca do resultado imediato da reunião são compreensíveis,
mas o ponto mais importante não é
esse. Qualquer que seja o resultado
imediato, uma constatação maior se
sobrepõe: a de que a iniciativa é um
gesto simbólico muito expressivo, demonstrando a compreensão por parte
do presidente da República de seu papel de estadista, acima das contingências da disputa política. Disputa que,
ao mesmo tempo, não lhe é indiferente. Será que esse padrão terá sequência
no futuro? Torçamos para que sim.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Festival de Gramado Próximo Texto: Frases
Índice
|