São Paulo, segunda-feira, 19 de agosto de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A epidemiologia e as manchetes

EDUARDO JORGE


A mortalidade infantil está em queda na cidade de São Paulo, chegando a 15,03 por 1.000 nascidos vivos em 2001


A mortalidade nos distritos paulistanos é tema de alta relevância. Para enfrentá-lo, a Secretaria Municipal da Saúde criou 41 distritos de saúde para gestão descentralizada, e estamos implantando o Programa de Saúde da Família, hoje com 500 equipes em operação -e 1.700 até 2004.
Reportagem publicada na Folha em maio destacava o crescimento da mortalidade em 38 dos 96 distritos administrativos da capital.
Mas a mortalidade infantil permanece em queda na cidade de São Paulo, chegando a 15,03 por 1.000 nascidos vivos em 2001. Esta queda não é banal. Podem-se dar os exemplos de São Caetano, Diadema e Campinas, cidades que tiveram sua queda contínua interrompida por uma ascensão em anos recentes. Isso ocorre em parte porque, quanto menor o índice, mais difícil baixá-lo e maiores são as oscilações. Quanto menor o valor, maior o número de mortes de controle mais difícil.
Outro aspecto a destacar é que a queda entre 2000 e 2001 foi de 5,8% (15,96 para 15,03 por 1000), mais do que o dobro da queda do ano anterior, que foi de 2,6% (16,39 para 15,96 por 1000). Dados do Proaim (Programa de Aprimoramento das Informações de Mortalidade) mostram que, do total de mortes infantis ocorridas na capital em 2001, 53% ocorreram no primeiro semestre e 47% no segundo, e o acompanhamento mensal projeta nova queda para o próximo ano.
O destaque para a ascensão em 38 distritos administrativos, por outro lado, poderia ser invertido pelo destaque na queda em 58 distritos administrativos entre 2000 e 2001. A propósito, entre 1999 e 2000 a ascensão ocorreu na cidade em 44 distritos, sendo que, destes, em 33 a ascensão foi interrompida em 2001.
Deve-se lembrar que a mortalidade infantil de qualquer cidade é uma média da mortalidade infantil de seus distritos e, quando tem variações pequenas, em alguns casos oscila para cima, em outros oscila para baixo. Afirmações sobre tendências da mortalidade infantil exigem o acompanhamento de períodos maiores de observação e, entre 1997 e 2001, em nenhum distrito administrativo da cidade de São Paulo houve aumento constante, ano a ano.
Os distritos que a matéria destaca como os de maior ascensão apresentaram flutuações nos últimos anos. Anhanguera, a maior variação positiva, oscilou, entre 1999 e 2000, de 11 para 5,4 por 1000 nascidos vivos. Socorro, no mesmo período, oscilou de 17,1 para 6,5 por 1000; Artur Alvim, de 16,9 para 8,4 e de 16,7 para 10,7 por 1000 nascidos vivos. Todos apresentaram oscilações para baixo em 2000, o que explica uma ascensão mais marcante em 2001.
Problemas dessa natureza aparecem ao se avaliarem os dados de áreas com pequenos números. Em estatística, esse fenômeno se chama variabilidade. Aumenta a variabilidade aleatória, ao acaso, quando se acompanham pequenos números no tempo.
Os 41 distritos de saúde são agregações dos 96 distritos administrativos. Não ocorreu aumento em todos os distritos administrativos de nenhum dos distritos de saúde, o que sugere que as variações aleatórias explicam grande parte dos padrões divulgados. Por outro lado, existe, sim, um diferencial entre os níveis de distritos de áreas carentes no centro velho e nas periferias e os distritos em áreas ricas do centro-oeste da cidade.
A razão dessas diferenças está nas desigualdades sociais existentes na cidade de São Paulo, problema que se reflete em aspectos relacionadas ao acesso a escolaridade, emprego e serviço de saúde, ao ambiente insalubre, enfim, aos riscos à saúde ligados a diferentes esferas da vida social e que exigem, para ser enfrentados, o engajamento de todos que considerem que é inaceitável a morte de uma criança com menos de 1 ano de vida.

Eduardo Jorge, 52, médico sanitarista, é secretário municipal da Saúde de São Paulo. Exerceu o mesmo cargo na administração Luiza Erundina.



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