São Paulo, quarta-feira, 19 de agosto de 2009

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SÉRGIO DÁVILA

A guerra sem fim

EM SEU EXCELENTE livro sobre as guerras do Iraque e do Afeganistão, Dexter Filkins conta como os afegãos desenvolveram uma tática militar que, embora não garanta a vitória, permite que eles tenham o menor número de baixas possível. "Assim, a guerra pode continuar para sempre", escreve o repórter em "The Forever War" (a guerra sem fim, em tradução livre).
Se há uma característica que distingue Barack Obama de seu antecessor, o republicano George W. Bush, é o saudável hábito do democrata de falar a verdade ao público -sempre que possível. Ao comentar os desafios no Afeganistão anteontem, o democrata disse que a guerra naquele país não será fácil nem rápida.
Aquela não é uma guerra por opção, segundo o presidente norte-americano, mas por necessidade. De fato. Ao Iraque, os EUA foram por engano, iludidos e sob falsa premissa. Era a "guerra de Bush".
Ao Afeganistão, tinham ido para capturar o autor do 11 de Setembro e seu bando. É a "guerra justa".
Faltou Obama dizer que o segundo conflito não é vencível.
Lutar contra a Al Qaeda é como combater a lei da gravidade ou, parafraseando um analista, declarar guerra à água. O grupo terrorista é um "não país", chefiado por um "não líder", cuja regra de combate é não seguir regras de combate tradicionais. Como um vírus, infiltra-se em regiões de governos fracos ou lenientes, caso do Paquistão e do Afeganistão, onde está hoje.
Obama e seu time sabem disso e, desde março, adotam a estratégia dos viciados: lutam uma batalha por vez. A atual é fortalecer o governo central afegão. Para isso, promovem uma coalizão que inclui os "senhores da guerra" (comandantes regionais de um país sem unidade nacional) e pode ou não incluir os talebans, principalmente o "baixo clero" do grupo extremista, que responde bem aos dólares dos EUA.
Também interessa aos obamistas a manutenção do atual presidente, Hamid Karzai, que, apesar de corrupto e dúbio em suas relações com o Ocidente, representa o "mal conhecido". É melhor do que recomeçar o trabalho do zero com um desconhecido.
É nesse contexto que acontecem as eleições afegãs de amanhã, que elegerá o presidente, dois vices e membros dos conselhos provinciais. Se tudo correr como a Casa Branca espera, Karzai vence no primeiro turno ou bate o ex-chanceler Abdullah Abdullah no segundo turno, e o país chega ao fim do ano com um comando central mais sólido.
Isso empurraria a Al Qaeda (e os talebans não adesistas) mais ainda para o vizinho Paquistão. Que então seria palco do novo capítulo da guerra sem fim.

sergio.davila@grupofolha.com.br


SÉRGIO DÁVILA é correspondente em Washington. Hoje, excepcionalmente, não é publicado o artigo de Delfim Netto.



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