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CARLOS HEITOR CONY
Pranto para o Manduka
RIO DE JANEIRO - Estava fora do Rio quando soube da morte de Manduka, um dos artistas mais perturbadores de sua geração. Filho de Thiago
de Mello e da jornalista Pomona Politis, afilhado do poeta Manuel Bandeira, Manduka trilhou um caminho
próprio em seu tempo, morando em
diversos países -Chile, Venezuela,
Alemanha, França, México, Espanha-, sempre compondo ou vivendo algum lance importante.
Na Argentina, fez com Augusto
Boal a trilha musical de "A Tempestade", uma adaptação da peça de
Shakespeare. Teve diversos parceiros,
inclusive Dominguinhos, com quem
compôs "Quem me Levará Sou Eu",
canção que ganhou um festival da
TV Tupi, interpretada por Fagner.
Amigo e devoto de Glauber Rocha,
fez a trilha sonora do documentário
de Erik Rocha sobre a passagem do
cineasta em Cuba. E assinou a trilha
de outro documentário importante,
sobre José Lins do Rego, de Vladimir
Carvalho.
Ultimamente, vinha desenvolvendo estudos de fusão em desenhos de
bico-de-pena com lápis de cor e pastel
seco, aliados à tecnologia digital. No
trivial variado de cada dia, era um
grande sujeito em todos os sentidos,
sabendo imitar Nelson Rodrigues,
Glauber, o próprio pai, com uma perfeição que dava medo.
Certa vez, imitando Glauber em
meu escritório, assustou um amigo
que entrou de repente e pensou num
milagre, custou a acreditar numa
imitação, pensou que Manduka era
realmente o Glauber redivivo.
Conheci-o criança, de castigo, na
editora em que Thiago trabalhava.
Manduka ficara em segunda época e
o pai levava-o a todos os cantos, obrigando-o a repassar as matérias. O
garoto fingia estudar, me olhava com
a cara de quem estava perdendo tempo. Um tempo que agora se fechou,
para o pai e para o amigo.
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