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TENDÊNCIAS/DEBATES
Somos irmãos
EVO MORALES
Com toda a sinceridade, quando penso no Brasil, penso num irmão maior, num povo alegre que, como o boliviano, quer viver bem
OUVI DIZER que os meios de comunicação brasileiros disseram que a Bolívia teria "humilhado" o Brasil. Pode o povo irmão boliviano humilhar o povo irmão brasileiro? É aceitável que, em pleno século 21, estejamos pensando em termos
de "humilhação", de "submetimento"
ou de "subordinação" quando os destinos de todos os povos sul-americanos estão indissoluvelmente ligados
para derrotar a fome, o esquecimento
e o colonialismo externo?
Devo lhes dizer com toda a sinceridade que, quando penso no Brasil,
penso em um irmão maior, em um
povo alegre e dinâmico que, como o
boliviano, quer "viver bem", quer acabar com a pobreza e quer ser dono de
seu futuro.
Quando, no dia 1º de maio, decretamos a nacionalização de nossos hidrocarbonetos, o fizemos para recuperar um recurso natural que foi inconstitucionalmente privatizado pelos governos neoliberais.
Para a Bolívia, não existe futuro
sem a recuperação do controle sobre
todos os nossos recursos naturais e as
empresas estatais privatizadas. Não
queremos fazê-lo de maneira negativa, atropelando ou ofendendo. Por isso, propusemos a renegociação de novos contratos com todas as empresas
estrangeiras, para que os ganhos sejam distribuídos de maneira mais justa e eqüitativa.
Não queremos abusar de ninguém,
não queremos nos aproveitar de ninguém... só o que nós queremos é um
trato justo, para que não sobrem migalhas em nosso país e para que possamos começar a construir um amanhã diferente.
Se cheguei à Presidência de meu
país, foi graças à luta de muitos anos
de meu povo pela nacionalização de
nossos recursos naturais. Por isso, a
primeira coisa que fiz no governo foi
satisfazer esse anseio, atender a esse
clamor. Sei que alguns poderosos se
sentiram surpreendidos, contrariados e incomodados. Sinto muito, mas
já era de começar a chover para todos.
A nacionalização dos hidrocarbonetos na Bolívia não tem porque provocar incertezas no Brasil. Mesmo
nos momentos mais difíceis de nossa
história, nós mantivemos nossas exportações de gás ao Brasil, e vamos
continuar fazendo o mesmo. As modificações que estamos negociando
não têm porque afetar o consumidor
brasileiro, já que são extremamente
pequenas, levando em conta que a receita da Petrobras em 2005 foi 24 vezes maior que todas as exportações
mundiais da Bolívia no mesmo ano.
Em meus oito meses de governo,
aprendi que os grandes ricos e os novos conquistadores não dão a cara a
tapas para enfrentar o povo. Não! O
que fazem é provocar disputas entre
pobres, para nos enfraquecer, para
nos desunir, para nos distanciar uns
dos outros. Por isso, me entristece
muito quando procuram distanciar e
provocar um confronto entre os povos irmãos da Bolívia e do Brasil.
Eles, os que sempre estiveram em
cima, sabem que em nossa união está
a força, que, juntos, somos invencíveis. Por isso a insídia, por isso a mentira, por isso a calúnia. Por isso essa
retórica que procura nos converter
em seres egoístas que pensamos apenas em nós mesmos, em nosso bem-estar individual, nos esquecendo de
que compartilhamos um mesmo continente, um mesmo planeta.
A sorte do Brasil é a sorte da Bolívia,
da Argentina, do Uruguai, do Paraguai e de todos os países da região.
Em nossos tempos, já não podemos
pensar unicamente em termos de
país. Juntos, precisamos nos apoiar,
precisamos colaborar, precisamos
nos compreender uns aos outros.
Entre povos irmãos, precisamos
compartilhar, e não competir, precisamos nos complementar e fortalecer
nossa unidade sul-americana. Essa é
nossa agenda para a próxima reunião
da Comunidade Sul-Americana de
Nações que terá lugar em Cochabamba, Bolívia.
EVO MORALES AYMA é o presidente da Bolívia.
Tradução de Clara Allain.
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