São Paulo, terça-feira, 19 de dezembro de 2006

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ELIANE CANTANHÊDE

Quem é o louco

BRASÍLIA - Uma mulher esfaqueia o deputado ACM Neto na Bahia. Um homem se acorrenta a uma pilastra do Senado. E mulheres e homens não param de comentar o aumento de 91% que os deputados e senadores se autoconcederam no apagar das luzes de 2006.
Voltei de Nova York no domingo de manhã e, desde então, esse tem sido o assunto nos aeroportos, nas ruas, nos shoppings, até nas rodinhas do almoço de ontem no Itamaraty para ministros da Bolívia. A sensação é a de que Suas Excelências tramam um suicídio coletivo, ou clamam para serem atacados nas ruas, como foi ACM Neto (e nem sei se ele era a favor do aumento, contra ou muito pelo contrário). O fato é que ser parlamentar já foi algo nobre, mas está virando função de risco. Logo, logo vai precisar de um rótulo: "Ser deputado e senador é prejudicial à saúde -e ao erário".
Ou seja: "Prejudicial à minha, à sua e à nossa saúde". A legislatura que acaba é uma das mais lamentáveis das últimas décadas, maculada por mensalões e sanguessugas, impunidade corporativa, ascensão e queda do Severino. Aliás, o Severino deixou de ser exceção para virar a média. O "baixo clero" ascendeu dos subterrâneos e assumiu o controle. Há muitos e muitos anos se sabe que a remuneração de deputados e senadores é irreal, um convite à corrupção, e que precisaria algum dia ser corrigida com coragem e argumentos consistentes. Jamais no fim de uma legislatura como essa. Jamais por quem é sanguessuga ou inocenta sanguessuga. E jamais em 91%. Medida errada na pior hora.
A mulher da faca na Bahia é supostamente doida, e o homem que se acorrentou no Salão Azul também. Mas a frase dele no Congresso é impecável: "Alguém está louco, e eu acho que não sou eu". A diferença é que deputados e senadores estão naquela categoria vip: doidos, sim, mas ninguém ali rasga dinheiro. Muito menos dólar.

elianec@uol.com.br


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