São Paulo, quinta, 20 de março de 1997.

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A reforma política



A reforma política corresponde ao caminho efetivo para agilizar as reformas de que o país tanto carece
FERNANDO BEZERRA
Há sinais indicativos fortes, principalmente aqueles colhidos pelas pesquisas de opinião, de que a sociedade acha-se plenamente consciente da necessidade de serem empreendidas reformas constitucionais profundas. As dificuldades com que nos temos defrontado para fazê-las decorrem, segundo suponho, de duas circunstâncias.
A primeira advém do fato de que tenhamos deixado de aproveitar a redução de quórum, admitida pela revisão prevista na Constituição para os anos 1993/1994.
Dando-se conta plenamente de que o clima emocional sob o qual reuniu-se a Assembléia para elaboração da Carta de 88 -impedindo avaliação serena de certos aspectos, sobretudo respaldada na opinião nacional-, a nova Constituição permitiu fosse o seu reexame facilitado. Tratava-se de uma situação especial, sem embargo de que a tradição recomenda seja a aprovação de emendas constitucionais cercada de precauções.
Basta ter presente o capítulo da ordem econômica, em que, depois de fazer profissão de fé na economia de mercado, atendendo aos anseios nacionais, a Carta de 88 estendia o âmbito dos monopólios estatais, capitulando diante de pressões corporativas.
Tão flagrante era a contradição que foi possível alterá-la logo no início da presente legislatura. A partir daí, contudo, cresceram os óbices. Estes, a meu ver, provenientes da segunda circunstância a que passo a me referir.
O sistema partidário e eleitoral em vigor destoa integralmente da realidade apresentada por nossa sociedade. Esta divide-se em número limitado de correntes de opinião.
Em contrapartida, a legislação faculta que quaisquer grupos, independentemente de sua representatividade, possam constituir partido político e beneficiar-se das facilidades existentes, notadamente o acesso gratuito à televisão. Além disso, a vigência do sistema proporcional provoca uma grande dispersão, que confunde os eleitores, principalmente nas maiores concentrações populacionais.
De sorte que, de semelhante permissividade, resulta sistema partidário fragmentado. A inexistência de fidelidade partidária faz o resto. Sob tais condições, as negociações para efetivação das reformas constitucionais imprescindíveis tornam-se desnecessariamente complicadas.
Diante desse quadro, vem amadurecendo no seio de lideranças responsáveis o propósito de antecipar a reforma política. Precisaríamos, entretanto, formar, o mais rapidamente possível, consenso quanto à forma de encaminhá-la, a fim de que possamos aproveitar o ano de 1997, no qual não teremos eleições em qualquer nível.
Encontra-se no Senado, em condições de ser votado, o projeto do senador Sergio Machado, líder do PSDB, que contém uma proposição meditada e coerente quanto à maneira de introduzirmos o sistema eleitoral misto.
Semelhante proposição configura modo de encaminhamento que poderia ser denominado de global, isto é, a reforma política consideraria englobadamente toda a problemática relacionada ao tema.
O embaixador Jorge Bornhausen, presidente licenciado do PFL, vem de sugerir outra modalidade que precisaria ser considerada. Trata-se da seleção daqueles tópicos mais relevantes (fidelidade partidária, cláusula de barreira, sistema distrital misto), com o propósito de facilitar a formação da maioria requerida, submetendo-os à votação de modo autônomo.
O argumento que mobiliza é ponderável: emendas individualizadas teriam a vantagem de impedir a aglutinação de votos contrários a cada princípio, facilitando a obtenção do quórum qualificado exigido.
A seu ver, em seguida poderia ser considerada a emenda do senador Pedro Simon que prevê uma nova revisão constitucional para 1999, nos moldes da que deixamos de realizar em 93/94.
Assim, tudo leva a crer que é chegada a hora da reforma política. Além de imprescindível, por si mesma, com vistas à governabilidade do país, corresponde ao caminho efetivo para agilizar as reformas de que o país tanto carece e que contam hoje com o apoio da imensa maioria da população brasileira.

Fernando Bezerra, 54, empresário, é senador pelo PMDB do Rio Grande do Norte e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

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