São Paulo, Sábado, 20 de Março de 1999
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O governo deve reduzir a tributação sobre capital externo de curto prazo?

SIM
Dinheiro bom e dinheiro ruim

NATHAN BLANCHE

A crise de confiança vivida pela economia brasileira nas últimas semanas foi gerada tanto pela mudança do regime cambial quanto pela ausência de uma nova âncora nominal. Como consequência, o mercado cambial manteve-se pressionado, com a desvalorização atingindo níveis de até 84% e perdas de reservas de até US$ 5 bilhões.
Diante desse quadro, o governo trocou o comando do Banco Central e anunciou a orientação para as políticas fiscal, monetária e cambial. A equipe liderada por Armínio Fraga elevou os juros, anunciou um regime cambial de flutuação suja e divulgou as metas fiscais acordadas com o FMI. Não fosse esse posicionamento, a desconfiança se generalizaria para os pequenos investidores, promovendo uma perigosa corrida em direção a ativos reais.
Superada a fase inicial do choque, começou um processo de recuperação da confiança de curto prazo. A médio prazo, contudo, ainda restam dúvidas em relação ao grande desafio da economia brasileira: a mudança do regime fiscal. A reconquista da credibilidade depende da melhoria dos fundamentos econômicos e da nova agenda de reformas estruturais. Sem isso, a estratégia de curto prazo não se sustenta.
O fluxo cambial reflete essas incertezas. Os prêmios sobre os papéis brasileiros permanecem elevados, mantendo-se em cerca de 11 pontos percentuais acima da remuneração oferecida pelos títulos públicos nos Estados Unidos. As renovações de papéis privados estão praticamente suspensas, e as linhas de comércio resistem em voltar à normalidade. Sob o regime cambial atual, essas incertezas implicam pressões sobre a taxa de câmbio, influenciando de maneira direta as expectativas em relação ao país.
Estimular o ingresso de capitais de curto prazo é, portanto, inevitável. Seriam os primeiros recursos privados a voltar para o país, abrindo espaço para o retorno dos capitais de prazos mais longos. Os capitais de curto prazo têm como virtude reduzir a pressão cambial no mercado à vista, ao mesmo tempo em que demandam proteção nos mercados futuros.
Com isso, o comportamento esperado para a taxa de câmbio em períodos de normalidade é restabelecido: cotações mais baixas no curto prazo e taxas mais elevadas para prazos mais longos, refletindo o nível de incertezas econômicas. Seria indício de uma melhoria na confiança, estimulando a volta dos capitais menos voláteis.
A condução da política econômica deve priorizar a busca pela calma nos mercados, elevando juros e aumentando a oferta de divisas no mercado cambial. Melhorar o fluxo cambial é essencial para dar confiança aos investidores e, a partir daí, alongar prazos e diminuir prêmios. E, dado o nível de risco atual, nem seria razoável imaginar que esses capitais pudessem ser mais longos e menos voláteis. Não há, portanto, dinheiro bom nem ruim.


Nathan Blanche, 60, economista, é sócio da Tendências Consultoria Integrada.



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