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OTAVIO FRIAS FILHO
República dos marqueteiros
Mais do que nas outras vezes, os
marqueteiros eleitorais estão
sendo o bode expiatório desta eleição.
Passaram a ter um papel decisivo nas
eleições brasileiras na época da campanha de Collor, final dos 80, quando
se reproduziu, com o habitual atraso,
o fenômeno que já vinha se instalando
nos países desenvolvidos desde os
anos 60.
Desde então sua influência tem crescido junto com a desfaçatez. Pois no
início havia uma presunção de identidade de idéias, por assim dizer, entre o
publicitário e o candidato que ele
apoiava. Hoje, a atitude se profissionalizou por completo, sendo considerado natural que um marqueteiro tenha feito campanha para o adversário
na eleição anterior.
Os publicitários são considerados
responsáveis pela indiferenciação entre partidos e candidatos, embalados
na mesma atmosfera amena, familiar
e convencional dos anúncios de margarina. Atrelada à televisão, com pouco acesso a melhores fontes de informação e crítica, a maior parte do eleitorado é presa fácil das ilusões inoculadas ao longo do horário eleitoral
compulsório.
Tudo isso é dito em oposição, parece, a um passado em que programas
eram apresentados e discutidos, em
que as candidaturas enfeixavam correntes de opinião devidamente organizadas na forma de partidos estáveis
e coerentes, em que o eleitor escolhia
com método. Ora, esse passado idílico, se é que existiu em algum lugar,
decerto não foi no Brasil.
O que nos acostumamos a chamar
de marketing político sempre exerceu,
como é óbvio, um peso importante
em qualquer forma de democracia
eleitoral. Até entre os chimpanzés,
quando dois ou três líderes disputam
o controle do bando, é comum colherem frutos para com eles prodigalizar
os eleitores, os quais se tornam exigentes e mimados...
A "novidade" é que, na sociedade
contemporânea, em que tudo passa a
ser objeto de atividade profissional, o
marketing também se profissionalizou. Dotou-se de meios técnicos para
interpelar o eleitor ao lado dos quais o
comício, o panfleto, a assembléia parecem recursos da Idade da Pedra. A
audiência desproporcional da TV torna esse efeito ainda mais deformante
no Brasil.
Não se trata de defender tais publicitários, que introduziram a lógica da
mercadoria num palco de decisões até
há pouco ainda relativamente imune a
ela. "Culpá-los", porém, equivale a ignorar a metamorfose pela qual a política está passando em todo o mundo e
pensar que o movimento dos ponteiros no relógio é que causa a passagem
do tempo.
Da mesma forma que é impossível
impedir o uso de um recurso tecnológico se ele se mostra vantajoso, é inviável conceber eleições em que o marketing não mais esteja no epicentro de
toda a estratégia. Como qualquer linguagem, a do marketing também revela ao mesmo tempo em que oculta:
decifrá-la é talvez o maior desafio de
pedagogia política hoje em dia.
Nos comerciais de Collor, desde que
"lidos" adequadamente, desfazendo-se as inversões e deslocamentos da alquimia publicitária, tão semelhante à
dos sonhos, já estava latente muito do
que seria o seu governo. A única pedagogia que funciona em política é a da
auto-educação pela tentativa e pelo erro, mas a crítica alerta e ativa, em vez
de lamuriosa, também pode ajudar.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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