São Paulo, segunda, 20 de julho de 1998

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LIBERAL NO LONGO PRAZO

As novas idéias do economista-chefe e vice-presidente do Banco Mundial, Joseph Stiglitz, provocaram reações que, no limite, podem dificultar o seu entendimento.
Stiglitz afirma que o Consenso de Washington, a cartilha liberal seguida pela maioria dos países latino-americanos nas décadas de 80 e 90, é insuficiente e, em alguns pontos, equivocada. Ele pede maior atenção às possíveis virtudes da ação do Estado. Isso inclui limitações à liberdade dos capitais e mais ênfase em metas de desenvolvimento humano, muitas vezes sacrificadas em nome da obsessão com o combate à inflação.
Essas teses levaram a dois tipos de reação, cujo equívoco começa com a distorção que as idéias de Stiglitz sofrem nas mãos de seus críticos.
O primeiro equívoco é dizer que Stiglitz e o consenso pós-liberal seriam na prática uma volta ao populismo, à idéia perniciosa de que "inflação é bom" ou, no mínimo, de que "alguma inflação é bom". É um truque retórico. Incapazes de rever suas posições, os críticos projetam sobre o próprio Stiglitz a autocrítica que não querem fazer. Mas é razoável dizer que a crítica à obsessão com a inflação, em nome de uma agenda mais ampla, não equivale a negar a estabilidade e querer a volta ao passado.
O segundo equívoco é tomar o discurso de Stiglitz como uma afronta ideológica. Nesse caso, o equívoco está na transformação de um debate político legítimo numa luta do bem contra o mal. A dificuldade não é nova. No início do século, depois da crise de 29, ocorreu uma importante revisão das teorias econômicas liberais, também com incompreensões.
As grandes crises econômicas, aliás, costumam estimular as lideranças responsáveis a buscar políticas ativas, construtivas, capazes de reduzir os custos de um ajuste que seria talvez insuportável se efetivado apenas pelas forças de mercado.
Passada a crise, num movimento em boa medida pendular, quando tudo volta a funcionar, o respeito ao mercado também retoma vigor.
A oposição ao ultraliberalismo é legítima, a crítica ao mercado não é irracional. E, no longo prazo, é possível que todos sejam liberais.



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