São Paulo, terça-feira, 20 de agosto de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Política cultural e eleições
JOAQUIM FALCÃO
O Ministério da Cultura não tem recursos, instrumentos ou diretrizes para nenhuma ação nesse sentido. É quase um telespectador anônimo. Nestes tempos de globalização, talvez esteja nesse conteúdo o sucesso ou o fracasso da identidade cultural do país. A França lamenta até hoje uma política cultural errada. Tenta agora, talvez tarde, desesperadamente, desamericanizar sua televisão. Estavam substituindo o "savoir faire" pelo "american way of life", em nome de uma globalização que é apenas americanização. Segundo, cultura é emprego. Não se separa mais o potencial econômico da cultura da defesa e expansão de nossos valores, nossas artes, nosso patrimônio, nossa música, teatro e cinema, nossa gastronomia, nosso saber e nosso fazer. Hollywood que o diga e exemplifique, um produto cultural de exportação dos Estados Unidos de inestimável valor econômico e estratégico. Celso Furtado disse certa feita que a cultura de um povo expressa a qualidade de seu desenvolvimento. Ou seja, a perspectiva econômica nos diria da dimensão quantitativa do desenvolvimento, e a perspectiva cultural, da dimensão qualitativa. Faces da mesma moeda. Infelizmente, não temos nem mesmo dados estatísticos para orientar uma ação. Salvo o esforço de pesquisa de José Álvaro Moisés e a excelente disposição da Fundação Casa Rui Barbosa em ser um "Ipea" do Ministério da Cultura, estamos a pé e no escuro. Diógenes sem lâmpada. Finalmente, cultura é democracia. E democracia é mobilização e participação dos cidadãos na produção e difusão cultural de sua comunidade. Uma linguagem meramente burocrática e administrativa diria que é preciso descentralizar a gestão cultural federal. Isso é outro problema. Não cabe ao Estado fazer cultura. Cabe ao país e, sobretudo, às nossas comunidades. Cabe ao governo criar condições para mobilizar a comunidade. Isso é mais do que uma reforma administrativa. Para tanto é necessário que a comunidade se organize através das entidades do terceiro setor. E o governo viabilize a existência e a expansão dessas nossas entidades de cidadania. A cultura como um grande movimento, capaz de entusiasmar não só as grandes empresas, mas também o cidadão comum, as casas, os bairros, as comunidades, a cidade e o país, é o maior desafio. É consolidar a democracia. Receio que o governo federal, quando tem essa visão, não tem os instrumento necessários. A Lei Rouanet, como está, não estimula essa participação democrática. Ao contrário, proíbe o cidadão individual de ser um ativo financiador de sua comunidade. O debate cultural eleitoral é o momento propício para as reivindicações legítimas dos grupos de interesses, mas deve ir além. É também o momento para o país avaliar a adequação ou não entre as instituições e instrumentos do governo federal na área cultural e a invenção, criação e consecução do novo, que todos queremos. E de que precisamos. A partir daí, é elaborar as propostas que conjuguem o ideal com sua prática possível. Joaquim Falcão, 58, mestre em direito pela Universidade Harvard (EUA), é professor das faculdades de direito da UFRJ e da FGV-RJ. Foi secretário-geral da Fundação Roberto Marinho. Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Cláudia Costin: Quem tem medo de democracia? Índice |
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