São Paulo, sexta-feira, 20 de agosto de 2004

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JOSÉ SARNEY

Brasil no Olimpo, sem futebol

A bola da vez é a Olimpíada. Não temos ganhado medalhas, mas estamos felizes dentro das competições, e nossos locutores, de pulmão cheio, proclamam: "O Brasil não é só o país do futebol, mas de Olimpíada", embora a nossa equipe campeã mundial tenha sido eliminada.
O que não está caindo bem é essa exibição de choro dos atletas. O nosso homem do judô, esporte que julgamos duro e rude, coisa para feras, chorava mais que Ronaldinho quando perdemos a Copa de 98.
A Olimpíada tem a tradição de mais de dois mil anos, símbolo generoso do espírito de confraternização pelo esporte, realizada em Olímpia, na Grécia, que não era nem uma cidade, mas um recinto sagrado, com edifícios, monumentos e templos, cuja importância eram os jogos. O clima das competições era tão forte que, durante sua realização, todas as guerras eram suspensas para ser somente um tempo de jogos, competição e paz. Os exércitos, se tinham de passar por Olímpia, deixavam as armas e caíam na confraternização geral.
Algumas regras eram impostas, mais duras do que hoje. As mulheres casadas não podiam assistir aos jogos sob pena de serem condenadas à morte. Naturalmente, pelo ciúme dos gregos, para elas não serem seduzidas pelos bonitões atletas, estes mesmos que serviram de modelo para as belas esculturas gregas que nos chegaram até hoje, com figuras apolíneas. Outra regra bem mais justa era a adotada nas corridas dos carros puxados por cavalos. O ganhador não era o condutor, mas os cavalos. Afinal eram eles que faziam força. Hoje, esses cavaleiros que pulam obstáculos montados nos animais são os ganhadores.
Olimpíada já foi calendário: quatro anos, uma Olimpíada. Hoje, uma Olimpíada a cada quatro anos.
O inusitado está por conta das zebras: o desempenho da China e a derrota dos Estados Unidos no basquete para Porto Rico, com uma vibração enorme de todas as torcidas, naturalmente porque não suspenderam a Guerra do Iraque, que continua na cabeça das pessoas.
No colégio Cisne, no Maranhão, o professor Arimatéa não fazia olimpíada, mas maratonas, irmãs daquela: maratona de história, de latim, de português e outras mais. Uma vez, o senado do colégio -e tínhamos senado representando as turmas- foi reclamar de sua cunhada, dona Roseira, que estava tratando mal os alunos. Quando a comissão chegou e disse-lhe da reivindicação, o professor Arimatéa respondeu: "Quer dizer que eu não posso ter minha cunhada como empregada do colégio? É isso que decidiu o senado?". Virou-se para o grupo e disse: "Vocês que tomaram parte da maratona de história estão lembrados do que foi o 18 Brumário, quando Napoleão fechou a Assembléia dos Quinhentos? Pois é isso. Está dissolvido o Senado".
As olimpíadas do colégio eram como aquelas da Antiguidade, encerradas por cantos, poesia, música e bailados.
Agora é esperar que a nossa Daiane faça aqueles saltos incríveis da ginástica de solo, dance o "Brasileirinho" e caia com os pés firmes, sem erro.
Mas a sensação da semana foi a partida de futebol no Haiti. O povo gritando por Ronaldinho, e Lula, na platéia, marcando gol de placa.
No mais, Chávez saiu da maratona do plebiscito e já quer mais outros sete anos.


José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.


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