São Paulo, sexta-feira, 20 de agosto de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Fundo de combate à pobreza e à fome

MARÍA SOLEDAD ALVEAR VALENZUELA

Enquanto a globalização avança, mais de dois terços da população mundial vivem em condições de pobreza. Essa realidade dramática gera movimentos migratórios maciços, degradação ambiental, proliferação de doenças, tensões políticas e, definitivamente, efeitos negativos sobre os fluxos de comércio e de investimentos -efeitos esses que, por sua vez, fazem aumentar os níveis de pobreza global, numa espécie de círculo vicioso.
Apesar de a luta contra a pobreza e a fome não ser tema novo na agenda internacional e de existirem muitas declarações, iniciativas e compromissos propostos por governos para fazer frente a elas, a implementação dos acordos firmados tem sido escassa e lenta.
Nesse contexto, acreditamos que a proposta apresentada em janeiro deste ano pelo presidente do Brasil ganha relevância especial. A iniciativa, que teve o apoio do secretário-geral das Nações Unidas e dos presidentes da França e do Chile, e à qual se incorporou posteriormente a Espanha, busca criar uma aliança efetiva contra a fome e a pobreza, criando para isso um grupo de especialistas para estudar e propor fontes de financiamento adicional que contribuam na redução desses flagelos.
O grupo técnico deverá apresentar um relatório sobre os resultados de suas análises em setembro próximo. Esse relatório vai incluir medidas concretas para a obtenção de financiamento estável e contínuo, que possibilitem o cumprimento das Metas do Milênio até 2015. Serão incluídas propostas como a taxação do comércio de armas, modalidades relativas à evasão e aos paraísos fiscais e a emissão de direitos especiais de giro, entre outros.


Enquanto a globalização avança, mais de dois terços da população mundial vivem em condições de pobreza


O objetivo é avançar em direção à meta de reduzir para a metade, até 2015, o número de pessoas atingidas pela pobreza extrema e desnutrição -meta essa acordada na Cúpula do Milênio das Nações Unidas- e em direção ao cumprimento dos desafios fixados na Conferência de Monterrey e na Cúpula de Joanesburgo sobre o desenvolvimento sustentável.
A lista de mecanismos propostos não é completa nem final. Ela incorpora mecanismos voluntários e outros obrigatórios, com prazos de vencimento e níveis de cobertura diversos. Trata-se, antes de mais nada, de propor um cardápio de opções que permita abrir e promover um debate internacional a respeito do problema, ativando um processo de maior compromisso político com as Metas do Milênio.
Com relação a isso, o presidente Lula convidou os líderes mundiais para um encontro no dia 20 de setembro, em Nova York, na véspera da sessão de abertura da 59ª Assembléia Geral das Nações Unidas, com o objetivo de discutir as conclusões do grupo técnico. O objetivo do encontro é conseguir apoio político para a implementação de mecanismos financeiros viáveis que favoreçam a implementação efetiva das Metas do Milênio entre hoje e o ano 2015.
O governo do presidente Lagos participou dessa iniciativa desde o início, somando-se ao esforço conjunto com o Brasil, a França, a Espanha e o secretário-geral da ONU.
Como o Brasil, o Chile vê a campanha contra a pobreza não como um fim em si mesma nem como medida paliativa, e sim como parte de um processo integrado de desenvolvimento que deve incluir esforços no sentido de um sistema multilateral de comércio justo e eqüitativo, de aumento de fluxos de inversão e da criação de esquemas adequados de sustentabilidade da dívida externa entre os países altamente endividados. No centro desse processo está a necessidade de identificar mecanismos financeiros inovadores para promover o desenvolvimento e libertar o mundo da fome.
Com entusiasmo, o Chile promete se esforçar para fazer com que o encontro de 20 de setembro fortaleça uma associação que, obedecendo ao espírito da Declaração do Milênio e da Cúpula de Monterrey, mobilize governos, o sistema da ONU, instituições regionais e internacionais, o setor privado e organizações não-governamentais a fim de adotar acordos concretos para o alívio da fome e da pobreza, por meio de um processo de desenvolvimento que assegure o crescimento econômico sustentável nos países em desenvolvimento.

María Soledad Alvear Valenzuela, 49, advogada, é ministra das Relações Exteriores do Chile. Foi ministra-diretora do Serviço Nacional da Mulher (governo Patricio Alwyn) e ministra da Justiça (governo Eduardo Frei).

Tradução de Clara Allain



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