|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
O Congresso Nacional deve aprovar a entrada da Venezuela no Mercosul?
SIM
Muitas vantagens e uma responsabilidade
FABIANO SANTOS
TRAMITA NO Congresso Nacional mensagem presidencial
oriunda do protocolo de adesão
a partir do qual o Executivo fica autorizado a negociar prazos e condições
sob a égide dos quais a Venezuela passará a ser país-membro pleno do
Mercosul. Como em qualquer questão de política externa, ao Congresso
é demandada uma delegação para que
o governo, dentro de certos parâmetros e diretrizes e tendo em vista os
mais profundos interesses nacionais,
estabeleça acordos com outras nações a respeito de questões comerciais, econômicas, culturais etc.
É difícil fugir à conclusão de que se
trata de excelente negócio para a economia brasileira. Nossos vizinhos venezuelanos são compradores de produtos e serviços de empresas brasileiras com alto valor agregado. Além disso, a Venezuela é uma enorme potência energética. Em tempos de resolução de gargalos de infra-estrutura,
não é recomendável desconsiderar
nenhuma possibilidade de expansão
da capacidade brasileira e de nações
irmãs de gerar e distribuir energia.
Finalmente, o ingresso da Venezuela tem a enorme vantagem de permitir que imensas regiões do Brasil,
como o Norte e o Nordeste, conheçam as vantagens de participar de um
mercado comum no continente.
O Mercosul é uma ótima idéia, mas
é ainda uma realidade vivida apenas
pelos Estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste de nosso país.
Os argumentos contrários à aprovação da mensagem são na maioria
das vezes puramente ideológicos e,
embora controversos, até têm sua razão de ser. São, contudo, irrelevantes
para a matéria em discussão.
Algumas intervenções chamam a
atenção para o fato de que o grupo de
trabalho "ad hoc" constituído para
definição de prazos e condições de
adoção pela Venezuela do enquadramento normativo no Mercosul não
teria concluído seu trabalho e que isso impediria a tramitação da matéria
em nosso Legislativo. Argumento
meritório, sem dúvida, mas que não
passa de filigrana jurídica.
Ora, na mesma decisão do Mercosul que regulamenta a adesão de novos membros (decisão 28/05), encontra-se artigo que afirma não ser tal decisão um documento legal de aplicação imediata ao arcabouço jurídico
dos países-membros. Além disso, cronogramas e prazos, bem como o compromisso da Venezuela de aderir aos
termos regulamentares do Mercosul,
estão devidamente assinalados na
mensagem presidencial.
Trata-se, portanto, de questão política, e como tal deve ser tratada. O
ponto é: tem o Ministério das Relações Exteriores expertise e espírito
público para a condução do processo
de integração desse país ao mercado
comum? O Itamaraty talvez seja a
melhor e mais bem preparada burocracia pública do país, dotada de autonomia e continuidade institucional
adequadas ao atendimento do interesse nacional.
Além disso, o Congresso possui instrumentos, tais como as audiências
públicas e a prestação de contas, para
recuperar a delegação concedida no
momento em que sejam identificados
eventuais prejuízos decorrentes da
política pública em questão.
Por último, vale a pena refletir sobre o significado de uma eventual decisão contrária do Congresso Nacional com relação à mensagem.
O efeito não seria só um convite para que a Venezuela volte as costas para a América do Sul e retorne à condição de país caribenho. Seria também
uma agressão aos princípios norteadores da diplomacia parlamentar estabelecidos pela Constituição de 88.
O desiderato inscrito em nossa
Carta Magna é muito claro: devemos
lutar para construir um continente
integrado política, econômica e culturalmente. O Brasil, por suas dimensões e história, tem um papel de liderança a exercer nesse processo -esse
é seu destino e sua oportunidade para
fazer expandir nossa economia e tornar nossa sociedade mais justa. Abrir
mão dessa responsabilidade em nome de antipatias e fanfarronices dos
governantes de ocasião não parece
ser a opção mais inteligente nem a
que representa a amadurecida condução de política pública tão crucial.
FABIANO GUILHERME MENDES DOS SANTOS, 43, doutor em ciência política, é professor do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro) e coordenador do Núcleo de Estudos sobre o Congresso Nacional desse instituto.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Roberto Abdenur: Muitos riscos envolvidos
Índice
|