São Paulo, quarta-feira, 21 de julho de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

É preciso encarar o debate

LUIZ MARINHO, EDÍLSON DE PAULA OLIVEIRA e ADI DOS SANTOS LIMA

O crescimento recente da atividade econômica no Brasil traz expectativas positivas para a sociedade brasileira em termos de produção, emprego e renda. Mas traz também à tona uma série de problemas característicos de nossa realidade. Um deles refere-se à utilização abusiva das horas extras.
Não há uma pesquisa nacional periódica detalhada sobre as horas extras, mas os dados existentes permitem afirmar que esse é um problema que deve ser urgentemente encarado pelo movimento sindical brasileiro.
Os dados existentes mostram que as horas extraordinárias vêm crescendo significativamente nos últimos meses. De acordo com a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), do convênio Seade/Dieese, o percentual de assalariados realizando jornadas acima das 44 horas legais subiu de 43% para 47,3% na comparação entre o primeiro trimestre de 2003 e o mesmo trimestre deste ano. No caso específico do setor industrial, a mesma pesquisa mostra uma expansão ainda maior: de 41,6% para 46,3%, no mesmo período.
Entretanto o uso abusivo das horas extras não é um fenômeno apenas conjuntural, mas sim estrutural e recorrente em nosso país. O patamar da jornada média após 1988 caiu abruptamente, mas, ao mesmo tempo, observou-se forte crescimento do percentual de trabalhadores que pratica horas extraordinárias após aquele ano. A média de assalariados da indústria na Grande São Paulo que trabalhou além da jornada legal situava-se em 20% entre 1985 e 1988; 41% em 1996; e 45,6% em 2004.


As horas extras abusivas são bastante danosas ao país. Elas afetam diretamente a geração de empregos


De um lado, as empresas lançam mão largamente desse expediente, visando aumentar a produção num contexto econômico marcado por grandes incertezas e oscilações. De outro, muitos trabalhadores tomam as horas extras como forma de complementação de renda em um contexto de baixos salários -este é, inclusive, o principal argumento daqueles que trabalham além da jornada regular. Outros ainda temem perder o emprego em razão de represália da empresa por uma eventual recusa em fazer horas extraordinárias.
Sabemos que a legislação brasileira é em si bastante flexível quanto à realização de horas extras. Por essa razão, pretendemos estimular em breve essa discussão no Congresso Nacional.
A CLT, em seu artigo 59, permite nada mais que duas horas extras por dia, desde que pago um adicional obrigatório de pelo menos 50% superior à hora normal, como consta na Constituição Federal (art. 7, XVI). Por isso, diversos acordos coletivos buscam limitar esse excesso, seja por via da limitação quantitativa, seja pelo aumento do adicional da hora extraordinária. Contudo a questão, de modo geral, continua uma ferida social aberta.
De fato, as horas extras abusivas são bastante danosas ao país. Elas afetam diretamente a geração de empregos. Estima-se que, no Brasil, cerca de 5,3 milhões de empregos deixem de ser gerados em razão do excessivo volume de horas trabalhadas além da jornada legal. As horas extras prejudicam também a saúde e a qualidade de vida dos trabalhadores. E, em diversos casos, elas aumentam o próprio custo da atividade empresarial, por meio do pagamento de adicionais, da queda da produtividade, do aumento de acidentes de trabalho e processos trabalhistas.
Diante desse quadro, entendemos que é fundamental encontrar soluções alternativas. Não basta aumentar o adicional no valor da hora extra, já que os empresários tendem a continuar utilizando essa alternativa e a repassar o custo adicional para o preço do produto ou serviço. É necessário limitar as horas extras, criar parâmetros eficazes de controle e remuneração e estabelecer mecanismos de compensação das horas trabalhadas em horas de descanso. E isso deve ocorrer por meio do envio e da aprovação de uma nova lei de regulamentação das horas extras pelo Congresso e por meio da negociação direta entre capital e trabalho nos acordos coletivos.
Por considerarmos que o tema envolve os interesses da sociedade brasileira em geral, acreditamos que está mais do que na hora de encarar esse debate.

Luiz Marinho, 45, é o presidente nacional da CUT (Central Única dos Trabalhadores). Edílson de Paula Oliveira, 40, é o presidente da CUT-SP. Adi dos Santos Lima, 48, é o presidente da Federação Estadual dos Metalúrgicos de São Paulo.


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