|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
FERNANDO DE BARROS E SILVA
Urubu na Bienal
SÃO PAULO - "Há sempre um copo
de mar/ Para um homem navegar".
São versos do canto primeiro da
"Invenção de Orfeu", o longo poema que Jorge de Lima publicou em
1952, um ano antes de morrer.
A 29ª Bienal, que abre hoje no
Pavilhão do Ibirapuera para convidados e sábado para o público, está
organizada em torno das relações
entre "arte e política". E fez dos versos do poeta alagoano o seu título.
Entre o confinamento do "copo"
e o infinito do "mar" existe uma
tensão, na qual podemos (ou estamos condenados a) "navegar". Ou
o colunista "navega" demais?
Nota-se, já a partir dessa escolha
pouco óbvia (e da beleza complexa
que os versos exprimem), o compromisso dos curadores Agnaldo
Farias e Moacir dos Anjos com o
sentido de relevância da cultura.
Depois da "Bienal do Vazio",
quando mimetizou seu ocaso, a
mostra parece se reerguer, aliando
inquietação e esforço reflexivo.
Mas nada disso pertence ao universo do presidente da OAB de São
Paulo, Luiz Flávio Borges D'Urso.
Ele anda ouriçado com os "excessos" da Bienal. Em nota, solicitou
que os trabalhos de Gil Vicente sejam banidos da exposição, sob
ameaça de acionar a Justiça. D'Urso
viu incitação ao crime na série de
desenhos "Inimigos", em que o artista pernambucano retrata a si
mesmo atentando contra a vida de
figuras públicas -Lula, FHC etc.
Pode-se ou não gostar dos trabalhos, mas "crime" seria censurá-los. Nos anos 1970, Raymundo Faoro colocou a OAB na linha de frente
da luta pela democracia. D'Urso
transforma a seção paulista da entidade em sucursal do obscurantismo. Sua atitude é oportunista e sua
compreensão da arte é rudimentar.
Lembre-se que D'Urso foi líder do
"Cansei", em 2007, quando o acidente da TAM serviu de pretexto
para que uma fração da direita civil
se organizasse em torno do que
Cláudio Lembo chamou de "movimento de dondocas". O sr. Cansei
está de volta. Mas por favor: urubus
na Bienal, só os de Nuno Ramos...
Texto Anterior: Editoriais: Complicação eleitoral
Próximo Texto: Brasília - Eliane Cantanhêde: Paulada na imprensa Índice | Comunicar Erros
|