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CLÓVIS ROSSI
A barbárie nossa de cada dia
MADRI - Francho Barón, repórter
do jornal espanhol "El País", acompanhou, na semana passada, uma
incursão de um grupo especial da
polícia carioca pela favela do Rebu.
Voltou horrorizado. Mas, por mim,
o horror maior é que o horror "faz
tempo que deixou de ser notícia",
como escreveu Barón.
Posto de outra forma: os brasileiros nos acostumamos à barbárie cotidiana. Só nos agitamos quando a
barbárie sai da rotina diária, como
nos casos do conflito entre as polícias de São Paulo e do assassinato
da menina em Santo André pelo seu
seqüestrador.
Sobre este segundo episódio, recebo e-mail desesperado de um policial de Santo André, 50 anos, que
não identifico porque não pedi a devida autorização. "Estou abalado.
Não durmo há três dias. Não consigo tirar o evento da cabeça. Tenho
duas filhas da mesma idade da Eloá
e da Nayara. Lido com a violência,
mas não posso admitir hipocrisia,
fraqueza e o despreparo", diz.
A carta chegou domingo, antes,
portanto, do artigo do cineasta José
Padilha ("Tropa de Elite") e do sociólogo Rodrigo Pimentel na Folha
de ontem, em que culpam "os nossos políticos como um todo, que há
muito tempo sabem que precisam
reformar a segurança pública para
salvar a vida de milhares de brasileiros e que há muito tempo fracassam ao não levar essa tarefa a
cabo".
O policial de Santo André escreveu a mesma coisa ao atacar "governos fracos, hipócritas, medíocres, que desdenham da questão da
segurança pública".
Fecha o e-mail com um apelo:
"Estão destruindo as polícias. Ajudem-nos a salvá-las!".
Posso estar muito enganado, mas
tanto o diagnóstico de Padilha/Pimentel como o grito de socorro do
policial cairão no vazio, como tantos outros, assim que a barbárie
voltar a ser a usual, sem um pico como os da semana passada.
crossi@uol.com.br
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