São Paulo, terça-feira, 21 de outubro de 2008

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CLÓVIS ROSSI

A barbárie nossa de cada dia

MADRI - Francho Barón, repórter do jornal espanhol "El País", acompanhou, na semana passada, uma incursão de um grupo especial da polícia carioca pela favela do Rebu.
Voltou horrorizado. Mas, por mim, o horror maior é que o horror "faz tempo que deixou de ser notícia", como escreveu Barón.
Posto de outra forma: os brasileiros nos acostumamos à barbárie cotidiana. Só nos agitamos quando a barbárie sai da rotina diária, como nos casos do conflito entre as polícias de São Paulo e do assassinato da menina em Santo André pelo seu seqüestrador.
Sobre este segundo episódio, recebo e-mail desesperado de um policial de Santo André, 50 anos, que não identifico porque não pedi a devida autorização. "Estou abalado.
Não durmo há três dias. Não consigo tirar o evento da cabeça. Tenho duas filhas da mesma idade da Eloá e da Nayara. Lido com a violência, mas não posso admitir hipocrisia, fraqueza e o despreparo", diz.
A carta chegou domingo, antes, portanto, do artigo do cineasta José Padilha ("Tropa de Elite") e do sociólogo Rodrigo Pimentel na Folha de ontem, em que culpam "os nossos políticos como um todo, que há muito tempo sabem que precisam reformar a segurança pública para salvar a vida de milhares de brasileiros e que há muito tempo fracassam ao não levar essa tarefa a cabo".
O policial de Santo André escreveu a mesma coisa ao atacar "governos fracos, hipócritas, medíocres, que desdenham da questão da segurança pública".
Fecha o e-mail com um apelo: "Estão destruindo as polícias. Ajudem-nos a salvá-las!".
Posso estar muito enganado, mas tanto o diagnóstico de Padilha/Pimentel como o grito de socorro do policial cairão no vazio, como tantos outros, assim que a barbárie voltar a ser a usual, sem um pico como os da semana passada.

crossi@uol.com.br


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