São Paulo, quinta-feira, 21 de novembro de 2002 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES Os crimes dos jovens de classe média CLAUDIA COSTIN
Ao se indignar com a revoltante
ação de rapazes de Brasília em férias na cidade de Porto Seguro, uma leitora da Folha afirmou que não podemos, neste caso, responsabilizar a falta
de oportunidades pelo brutal crime. Parece fazer sentido, afinal estamos falando de jovens da classe média, com acesso a quase tudo que a sociedade oferece.
Complacência e amor não se confundem. É compreensível que famílias possam desejar um ambiente de conforto e carinho para seus filhos, mesmo que cometam atos nocivos, mas a colocação de seus rebentos acima da lei não se relaciona a nenhuma manifestação de afeto, e sim à vergonha social que não desejam viver. É, no limite, o que leva narcotraficantes do Acre, quando seus filhos cometem crimes, a sequestrar jovens seringueiros e induzi-los a assumir a culpa e a serem assassinados antes que se arrependam da "confissão" forjada. Essa questão representa um desafio às famílias de elite, tão acostumadas a um sistema de acesso diferenciado e de direitos desiguais: como educar para a inclusão e para a responsabilização, como aumentar a auto-estima e as oportunidades de diferenciação pelos talentos, e não pela prepotência decorrente de privilégios próprios de uma sociedade injusta, sem cair na complacência? Coloca, porém, um desafio ainda maior para as políticas públicas: por um lado, o da formulação de uma política de segurança que não estabeleça diferenças sociais na condenação de crimes e criminosos; por outro, a necessidade de trabalhar a convivência respeitosa e não excludente nas escolas e centros culturais voltados à juventude. O Relatório Delors menciona quatro pilares a embasar o processo educacional na Comunidade Européia: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver junto e aprender a ser. Não basta transmitir conteúdos e metodologias de pesquisa às crianças e aos jovens, nem mesmo educá-los para maior autonomia intelectual, condição essencial para uma aprendizagem permanente. É necessário prepará-los para viver em sociedade, respeitando regras que refletem a vontade codificada da maioria, atentos ao espaço e ao direito do outro e, sobretudo, embora os seres humanos tendam a supervalorizar suas qualidades e as do grupo a que pertencem e a alimentar preconceitos desfavoráveis em relação aos outros, capacitá-los para saudar a contribuição de cada grupo social como enriquecedora do ambiente. Um ambiente que pode e quer ser plural -sem exclusão social e sem incluídos excludentes e impunes. Chega de juventude dourada! Claudia Maria Costin, 46, mestre em economia pela FGV-SP, é presidente da Câmara Brasileira de Investidores em Energia Elétrica. Foi ministra da Administração Federal (governo FHC). Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Demétrio Magnoli: Lula e o espectro de Rio Branco Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
|