São Paulo, terça-feira, 21 de novembro de 2006

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Autocrata em formação

CONSUMOU-SE o golpe que o presidente da Bolívia, Evo Morales, vinha ensaiando contra a Assembléia Constituinte e contra as frágeis instituições do país. É cada vez mais indisfarçável o autoritarismo do novo dirigente boliviano, que, seguindo Hugo Chávez, já nem hesita em propor medidas escandalosamente antidemocráticas.
Na sexta, a Assembléia definiu que a maioria para promulgar a nova Constituição é de 50% dos votos mais um. Tal decisão torna letra morta a Lei da Convocatória, que fixava maioria de mais de dois terços. Com base nessa lei os bolivianos foram às urnas e elegeram seus constituintes.
O golpe veio porque Morales e seu MAS (Movimento ao Socialismo) só foram capazes de eleger 52,5% dos constituintes. Para tentar justificar a atitude, acorrem ao realismo fantástico: como a Assembléia é poder originário, tem legitimidade para mudar a norma que a convocou.
A agenda de Morales para aniquilar adversários e instituições agrega, ainda, uma proposta de lei dando ao Congresso, dominado pelo MAS, o poder de cassar governadores. Seis dos nove chefes locais são oposicionistas.
O presidente da Bolívia também reinterpretou a seu favor o referendo sobre autonomia. Na consulta à população, em julho, ficou claro que os resultados em cada um dos departamentos (Estados) seriam considerados em separado. Após o pleito por mais autonomia triunfar em quatro dos mais ricos departamentos, Morales passou a dizer que o referendo era nacional.
O vezo autoritário do dirigente na política contrasta com suas atitudes cada vez mais brandas na economia. Morales parece estar convencido de que a receita para perpetuar-se no poder passa por dividir o país, dizimar a oposição e entender-se com as multinacionais que, para o público interno, finge combater.
Dessa forja costumam surgir ditaduras.


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