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CLÓVIS ROSSI
Fisiologia, a mãe da corrupção
PARIS - Para entender melhor como nascem os grandes trambiques
que acabaram por se transformar
no pão de cada dia da política brasileira, basta ler a nota em que o ministro da Justiça, Tarso Genro, separa "uma relação fisiológica" das
relações "delituosas".
O ministro se diz preocupado em
evitar que políticos cujos nomes
aparecem em certas listas, ao lado
de um valor em dinheiro, sejam tomados como delinqüentes, quando
pode ser que estejam na relação
"apenas" por causa de liberação de
emendas ao Orçamento, ou seja,
por conta da fisiologia.
A preocupação em si é legítima.
Mas revela, ao mesmo tempo, a cultura política que dá origem a quase
todos os trambiques com dinheiro
público.
Antes de chegar ao poder, aliás, o
PT era o que mais gritava -e com
razão- contra o "fisiologismo".
Agora, um de seus expoentes,
sempre candidato frustrado a ideólogo, é o primeiro a aceitar que a fisiologia é a moeda corrente do jogo
político-parlamentar.
A fisiologia, na prática, significa o
seguinte: o parlamentar usa dinheiro público para fazer o seu nome
junto ao eleitorado, levando supostamente uma obra qualquer para
sua região. Em troca, o governo que
liberou o dinheiro (repito, dinheiro
público, não do governo) passa a
contar, pelo menos em tese, com o
voto do parlamentar ou, no mínimo, com a sua mansidão em relação
a comportamentos indevidos de
autoridades.
Se a obra é de fato necessária, não
seria necessária a barganha fisiológica. Se não é, trata-se no mínimo
de desperdício de recursos públicos, aliás muito escassos.
Esse varejo político que se fortalece governo após governo é a mãe
de relações incestuosas entre o governo e os parlamentares e entre
estes e o setor privado. Ao tratar
com condescendência a fisiologia, o
ministro da Justiça só reforça o incesto, que leva ao delito.
crossi@uol.com.br
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