São Paulo, segunda-feira, 22 de julho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BORIS FAUSTO

Populismo paulista

Como entender a posição, embora não definitiva de Paulo Maluf, nas pesquisas eleitorais para o governo de São Paulo, em torno de 40% das intenções de voto? Como entender o avanço de uma figura política que muitos presumiam liquidada, ao peso das denúncias de corrupção, da demagogia, das grosserias machistas?
A história de São Paulo contém uma parte da explicação. Maluf, como pouca gente ignora, constitui talvez o último, mas ainda vicejante rebento do populismo de direita paulista, um fenômeno que não encontra similiar em outros Estados do país.
Não é fácil entendê-lo, porém o certo é que ele se cristalizou, a partir do antecessor de Maluf -Ademar de Barros. Ademar veiculou a imagem da capacidade de realização a qualquer preço, expressa em fórmulas do gênero "vamos acelerar o Brasil", ou "fé em deus e pé na tábua". Atraiu setores de uma sociedade em transição -pequenos e médios comerciantes, alguns empresários, a massa plebéia presa a serviços pouco valorizados- pela via da crença indefinida nos "negócios". Alternativa primária, mas eficaz, que insistia na importância de "fazer o dinheiro rolar", em vez de enveredar pelo tema complexo do desenvolvimento econômico.
Opondo-se ao udenismo bem-comportado e ao histrionismo janista, que incorporava como tema central de seu discurso a cruzada contra a corrupção, o ademarismo caracterizou-se ainda por uma "política de resultados", o célebre "rouba, mas faz" , estranha fórmula que seus partidários sustentaram diante de acusações difíceis de contestar.
Com tais instrumentos, Ademar projetou-se no cenário nacional, garantindo a vitória de Getúlio, nas eleições de 1950, e alcançou 26% dos votos nacionais em 1955, ganhando em São Paulo.
Se há uma filiação genética entre Ademar e Maluf, há também muitas diferenças, derivadas de contextos históricos diversos. O estilo se assemelha, os pressupostos não-éticos também, mas hoje há novos e valiosos trunfos para a disseminação de um populismo de direita. Dentre eles, avulta o trunfo da segurança.
Por mais que o governador Geraldo Alckmin se dedique a enfrentar um quadro muito grave, subsiste o fato de que a visibilidade dos êxitos é lenta, numa área em que a explicável sensação de medo se sobrepõe ao raciocínio. Campo fértil para a atração pelo discurso populista, com suas supostas medidas implacáveis, capazes de nos devolver rapidamente a tranquilidade - uma saída tão compensadora quanto falsa para uma situação-limite.
Ainda assim, as acusações contra o candidato não deveriam pesar no eleitorado que não é malufista em qualquer circunstância? Só até certo ponto. Como tem lembrado Luís Nassif, em sua coluna desta Folha, o denuncismo que tomou conta de boa parte da mídia, ao longo dos últimos anos, banalizou acusações de corrupção, alcançando a honra de muita gente séria. Além disso, o oportunismo eleitoral acabou reabilitando cidadãos "acima de qualquer suspeita", fato inadmissível há não muito tempo.
Por que não pensar, nesse contexto, que "todos os políticos roubam", mas só alguns são capazes de fazer?


Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Vacas e chicletes
Próximo Texto: Frases
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.