São Paulo, domingo, 22 de setembro de 2002

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EXEMPLO PROBLEMÁTICO

Nem mesmo o México, tido por muitos como o país de economia mais sólida na América Latina graças a sua integração com os EUA, escapa de sofrer bastante com o contexto internacional adverso. Depois de cair 0,3% em 2001, a economia mexicana segue fraca em 2002: projeta-se que cresça 1,6%, taxa similar à esperada para o Brasil.
Mesmo muito menos dramáticas que as da Argentina ou da Venezuela, as dificuldades do México chamam a atenção porque sua opção de aprofundar radicalmente a integração com os EUA é apontada como exemplo a ser seguido pelo Brasil.
Alguns dos defensores da adesão do Brasil à Alca enfatizam os benefícios que o Nafta (o acordo de livre comércio com os EUA e o Canadá firmado há quase dez anos) trouxe ao México, com destaque para a imensa expansão das exportações, sobretudo das dirigidas aos EUA.
Como expandir as exportações se tornou prioridade no Brasil, é natural que o exemplo mexicano pareça tentador. Mas cabe observar que o salto das exportações não garantiu à economia mexicana um ritmo de crescimento alto nem deu solidez às suas contas externas. Apesar de ter-se beneficiado do forte crescimento dos EUA de 1992 a 2000, o México cresceu 3% ao ano na década de 1990. E seu déficit em transações correntes caminha para fechar 2002 em US$ 17 bilhões -valor similar ao do Brasil.
Além desses aspectos menos atraentes da experiência mexicana, há que lembrar diferenças entre a sua economia e a do Brasil. A mais evidente é geográfica: a vizinhança dá aos bens mexicanos grande vantagem competitiva nos EUA (sobretudo nos ramos em que os custos de frete pesam muito no preço final).
Outra diferença diz respeito ao grau de integração comercial com os EUA. Antes do Nafta, o México já destinava a maioria de suas exportações aos EUA; o Nafta aprofundou essa integração, elevando o peso dos EUA nas exportações mexicanas para a casa de 80%. No Brasil, hoje, essa proporção é 25%.
O Brasil comercia intensamente com todas as regiões do globo. Por isso, aderir à Alca implicaria dar prioridade a um parceiro comercial que hoje não é preponderante, sacrificando possibilidades de comércio com outros parceiros importantes, como a Europa e a Ásia.
Esses aspectos sugerem que há espaços de complementaridade com a estrutura produtiva dos EUA que já foram ocupados pelo México. Mesmo que fossem beneficiados por uma redução de barreiras, os bens brasileiros teriam dificuldade para tomar nichos de mercado dos mexicanos. Ao lado disso, diversos ramos da estrutura produtiva brasileira, sobretudo na indústria, tenderiam a ser ameaçados pela maior concorrência com os produtos dos EUA.
Os cuidados na negociação da Alca têm de ser grandes. A fragilidade das contas externas enfraquece a posição negociadora brasileira. Seria lamentável que isso levasse a priorizar ganhos de curto prazo em troca de concessões que podem ter alto custo num horizonte mais longo.


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