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Amazônia bilionária
Noruega doa US$ 1 bilhão contra desmate; fundo custeará projetos de conservação, mas há dúvida sobre fluxo futuro
A MATERIALIZAÇÃO do
Fundo Amazônia foi
rápida. Proposto em
dezembro na conferência sobre clima de Bali, o mecanismo de incentivo à redução
do desmatamento foi oficializado pelo governo Lula em agosto e
recebe agora um depósito pioneiro, da Noruega. O ceticismo
inicial com o potencial de doações voluntárias foi desfeito pelo
país escandinavo, que prometeu
aportar US$ 1 bilhão até 2015.
Para aquilatar o significado da
cifra, basta dizer que monta ao
dobro do que o governo brasileiro orçou para combater o desmate de 2008 a 2010. Por ora, US$
20 milhões foram depositados;
US$ 120 milhões virão nos próximos meses, totalizando os US$
140 milhões anuais previstos.
Os aportes anuais só ocorrerão
se o Brasil mantiver a taxa de
desmatamento abaixo dos
19.500 km2 médios do decênio
1996-2005. Foi o caso de 2006,
que ficou 5.500 km2 aquém disso. O equivalente a 200 milhões
de toneladas de CO2 deixou de
ser emitido na atmosfera e, assim, de agravar o efeito estufa.
Cada tonelada poupada dá direito a utilizar US$ 5 do fundo.
Portanto, o resultado de 2006
credita US$ 1 bilhão ao país. Seria preciso, porém, obter mais
doadores, pois só US$ 140 milhões estão garantidos no período. Há negociações em curso
com Coréia do Sul, Japão, Suíça,
Suécia e Alemanha, além de empresas estrangeiras e nacionais.
O fundo tem administração do
BNDES, que selecionará projetos de vários tipos, da recuperação de áreas degradadas ao uso
sustentável de florestas. Está em
debate, ainda, remunerar comunidades e proprietários que preservarem matas e se comprometam a fazê-lo no futuro.
Trata-se de mecanismo inteligente, com potencial para deflagrar um círculo virtuoso na
Amazônia. Cria forte incentivo
para o governo perseverar na política antidesmatamento, pois os
fundos ficarão indisponíveis se a
devastação não for contida.
Ao mesmo tempo, o fundo
contorna de maneira engenhosa
a objeção tradicional, baseada no
argumento da soberania nacional, à necessidade de fiscalização
por doadores estrangeiros. O benefício fica vinculado a um desempenho já concretizado, e
proporcional a ele. Países ricos
pagam ao Brasil por fazer o certo, sem com isso ganhar jurisdição sobre nossas políticas.
A dúvida que cerca o Fundo
Amazônia, por ironia, diz respeito à sustentabilidade. Não é certo que venham mais doações voluntárias. Defensores da redução compensada de desmatamento advogam que o fundo deve evoluir para um mecanismo
de mercado, em que emissões
evitadas revertam em benefício
também do financiador (créditos de carbono).
É de esperar que o fluxo espontâneo venha a minguar,
quando aumentar a necessidade
de recursos, nessas nações, para
pagar outras despesas da mudança climática. Entre elas, a redução das próprias emissões de
gases do efeito estufa e a adaptação da infra-estrutura aos impactos do aquecimento global.
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