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São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 2003

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ANTONIO DELFIM NETTO

Lavoura da salvação

No meio da cacofonia produzida por "ruídos" de toda sorte nas últimas semanas, um setor afinou seus instrumentos: a agricultura. Ele também não tem sido poupado das ações perturbadoras que se produzem dentro do governo ou pelo menos com a sua complacência. É o caso do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que, a cada momento, vai revelando que o importante não é ter terra, é organizar a sociedade brasileira de acordo com generosos propósitos: nada menos do que eliminar a propriedade privada e construir um mundo igualitário, ainda que miserável. Erra quem pensa que a "complacência" foi o ato simbólico do presidente Lula de colocar o boné do MST. "Complacência" é a liberdade com que são usadas as verbas do Orçamento para estabelecer e sustentar materialmente as invasões. Tudo de que o MST precisa é a lei, como demonstrou em silêncio o governador de São Paulo.
É verdade que até agora a inquietação levada ao campo não tem impedido o enorme avanço que o setor vem registrando desde a mudança da política econômica realizada nos últimos três anos, quando a área financeira do governo Fernando Henrique foi derrotada pelo ministro Pratini de Moraes. Depois de ter praticamente estagnado no nível de 80 milhões de toneladas nos sete anos que separam as safras de 1993/94 e 1999/2000, a produção brasileira de grãos registrou um salto:



O aumento deu-se, basicamente, pela ampliação da produtividade/ha, estimulada pela pesquisa genética da Embrapa, pelo uso de insumos modernos e pelo programa Moderfrota, que mostrou ao país que, em circunstâncias adequadas, podem-se construir setores com vantagens comparativas. O Brasil só não sofreu consequências ainda mais graves da vulnerabilidade externa em que foi metido porque o setor do agronegócio propiciou superávits comerciais crescentes.
O presidente Lula foi muito feliz ao escolher um "não-companheiro" para comandar o ministério da Agricultura, o agrônomo Roberto Rodrigues, um ST (sem partido), figura reconhecidamente competente (até pelo seu DNA!). Sem alarde e sem "bater a cabeça" com ninguém do governo, o ministro Rodrigues obteve do Ministério da Fazenda, em tempo hábil, o Plano Agrícola e Pecuário para 2003/ 04 com recursos de R$ 32,5 bilhões (na safra 2002/03, o montante do crédito oficial foi de R$ 27 bilhões) e garantiu as linhas de crédito com juros de 8,75%. Houve também um avanço do seguro agrícola.
Os assentamentos rurais, por mais organizados que sejam, continuarão com uma produção marginal para autoconsumo e não terão importância na oferta para o mercado. Talvez um efeito mais significativo seja produzido pela ampliação do estímulo às cooperativas de crédito. Mas há alguns problemas graves: 1º) a Embrapa está sendo sucateada por falta de verba. Sua falta vai ser sentida logo adiante e, 2º) se não enfrentarmos com inteligência e sem preconceitos o problema dos transgênicos, uma boa parte desse enorme e bem-sucedido esforço vai terminar sendo a maior trapalhada do governo Lula...

Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br


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