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BORIS FAUSTO
O presidente e sua imagem
Ele vai tomar café frio, como outros presidentes da República em
final de mandato, diziam alguns, repetindo uma frase banal. Outros diziam
coisas piores, anunciando uma renúncia, à maneira de Raúl Alfonsin.
Nada disso aconteceu. Pelo contrário, o presidente está no centro da vida
política até o final do mandato, tendo
um papel vital, sem desprezar a contrapartida de Lula, na forma auspiciosa pela qual se deu a transição. Para
completar, na pesquisa de opinião pública realizada por esta Folha [editada
no caderno especial Anos FHC, em
19/12", Fernando Henrique foi escolhido como o melhor presidente que o
Brasil já teve, superando até mesmo
um dos nossos poucos mitos políticos: Getúlio Vargas.
A discriminação da pesquisa por Estados e pelo Distrito Federal confirma
algumas verdades sabidas e fornece,
ao mesmo tempo, certas indicações
que estão a merecer investigações e
análises mais aprofundadas. Exemplificando, o primeiro lugar conferido
a Juscelino em Minas e em Brasília
dispensa maiores comentários, mesmo quando se constata que Fernando
Henrique e Getúlio somados superam
largamente Juscelino.
Mas a preferência regional não se
aplica inteiramente ao caso do Rio
Grande do Sul, em que Getúlio -nascido e sepultado no Estado, de onde
partiu para projetar-se no cenário nacional- supera o atual presidente
por apenas 1 ponto. Penso que a divisão estreita das preferências reflete a
vida política do Rio Grande que, desde os tempos do Império, caracteriza-se pela diversidade de opiniões, pelo
aguerrimento e pelas maiores opções
partidárias.
Ao mesmo tempo, chama a atenção
a nítida vantagem de Getúlio no Rio
de Janeiro, onde Fernando Henrique
fica em um distante terceiro lugar.
Tudo indica que a acirrada disputa
entre getulistas e anti-getulistas, especialmente na ex-capital federal, sob a
roupagem do lacerdismo e do anti-lacerdismo, acabou redundando na vitória getulista. Insinua-se aí a imagem
de um Rio com forte predominância
populista, onde o PT se dilacera e o
PSDB carece de expressão, embora o
populismo varie de nomes, da estrela
cadente Brizola ao luzente Garotinho.
Por outro lado, é significativo constatar que o janismo virou pó, com 1
ponto nas preferências, e que, afora os
três minguados pontos do general Figueiredo, nenhum presidente militar
aparece na lista, não obstante a existência da figura paternal-autoritária
do general Geisel e de seu importante
papel no processo da abertura.
Pensando em pesquisas futuras, a
partir das relações entre imagem e
memória, podemos nos perguntar se
o mito Getúlio manterá consistência,
ou se os dados de hoje são indicativos
de um declínio. Ou se a imagem de
Fernando Henrique, que felizmente
não se converterá em mito, ganhará
novas dimensões.
São questões para nós sem resposta.
Hoje, o certo é que o presidente vai
deixar o cargo bastante prestigiado, a
tal ponto que muita gente infensa ao
discurso populista começa a acreditar
que, às vezes, "a voz do povo é a voz
de Deus".
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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