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Indolência fiscal
Entre as causas estruturais da crise no setor aéreo se destaca o contingenciamento aleatório de recursos
OS AEROPORTOS brasileiros viveram ontem
mais uma jornada de
caos e desrespeito aos
usuários. Dando asas à incompetência com que vem lidando com
a crise -que já se arrasta há mais
de dois meses sem sinal de solução-, tudo o que o governo Lula
se prontificou a fazer foi oferecer
aviões da FAB para "ajudar" no
transporte de passageiros.
A demagogia evidentemente
não vai resolver nada. Não vai
apagar o rematado fracasso de
diversas instâncias do governo
federal ao lidar com a crise. Tampouco esconderá o desleixo na
forma aleatória como a gestão
Lula conduz o ajuste fiscal -como ocorria, de resto, sob FHC-,
preocupada só com o resultado
global do caixa. Essa incúria está
entre as principais causas estruturais do descontrole aéreo.
Faltaram investimentos na expansão e na modernização do
sistema de controle do espaço
aéreo; houve pane na alocação de
recursos humanos necessários
para lidar com um mercado em
expansão; as agências governamentais observaram passivamente o decréscimo substancial
na qualidade e na oferta dos serviços oferecidos pelas empresas
com problemas financeiros. Fica
evidente que as companhias não
foram capazes de absorver a expansão da demanda.
A crise explicitou os impactos
perversos do ajuste fiscal efetuado de forma linear, cortando a
esmo previsões orçamentárias e
contingenciando de maneira
uniforme os recursos. Foi solenemente desprezada a relevância estratégica e operacional de
cada item de gasto, como destacou relatório recente do TCU
(Tribunal de Contas da União).
As ações de governo dirigidas a
operação, manutenção e desenvolvimento do sistema de controle do espaço aéreo brasileiro
deveriam ser custeadas quase
que integralmente por receitas
decorrentes de tarifas. Mas o Tesouro Nacional toma grande parte dos recursos do sistema aeroportuário e os lança em seu cofre
para fechar as contas.
Segundo o TCU, nos últimos
seis anos o governo deixou de repassar ao Comando da Aeronáutica cerca de R$ 582 milhões. Assim, limitou a capacidade das
instituições de prover com efetividade o serviço de controle do
tráfego aéreo, bem como de ampliar sua capacidade operacional
para absorver o fluxo crescente
de passageiros.
Se a Infraero e o Tesouro Nacional garantissem a transferência e o uso das receitas arrecadadas pelo sistema aéreo, ele poderia se auto-sustentar, o que viabilizaria a sua manutenção e a
sua modernização.
A Aeronáutica recebeu recursos extras para compra de equipamentos e foi autorizada a fazer
concurso para contratação de
mais controladores. A persistência da crise, no entanto, demonstra a necessidade de aperfeiçoar
o planejamento do sistema de
tráfego aéreo brasileiro, projetando o aumento da demanda de
vôos, estimulando a concorrência por meio da autorização para
a entrada de novas empresas etc.
A baderna aérea demonstra,
sobretudo, a necessidade urgente de acabar com o modo preguiçoso de fazer ajustes fiscais no
Brasil. Quantos outros "apagões"
não estarão em gestação devido a
esse mesmo mal de origem?
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