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RUY CASTRO
Bulas do terror
RIO DE JANEIRO - O fim do ano
chegou e, com ele, o prazo dado pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que todo medicamento vendido no Brasil passe
a vir com duas bulas. Uma, dentro
da caixa, em linguagem acessível ao
leigo e em corpo e espaço adequados aos pacientes -os quais, apesar
do nome, não têm paciência para
ler a dita por causa da vista cansada.
A outra, eletrônica, no site da Anvisa, na linguagem mais técnica possível, apenas para os médicos, e esses que se virem.
Pelo visto, a medida ainda não
entrou em vigor. Outro dia, ao sair
do banho num hotel em cidade estranha, dei uma estúpida topada
com a canela na borda do azulejo do
box. A perna inchou, ficou vermelha e, pelos dias seguintes, como o
dodói não passasse, resolvi tomar
providências. Bem à brasileira, uma
amiga me examinou por telefone e
receitou uma pomada. Comprei-a e
apliquei. E só então li a bula.
"Este medicamento (fator de difusão enzimática)", dizia o texto, "é
composto de mucopolissacaridases
com atividades condroitinásica e
hialuronidásica, despolimerizando
os mucopolissacarídeos (ácidos
condroitino-sulfúrico e hialurônico) da substância fundamental do
tecido conjuntivo, especialmente
subcutâneo. A despolimerização
da substância fundamental das trabéculas conjuntivas do tecido subcutâneo facilita as trocas metabólicas locais".
A transcrição é literal. Pois li e entrei em pânico -imagine se os mucopolissacarídeos, ao despolimerizar as trabéculas conjuntivas, provocassem uma reação das atividades condroitinásica e hialuronidásica? O que seria de mim?
Por sorte, nada disso aconteceu
-ou, quem sabe, aconteceu- e o remédio logo começou a fazer efeito.
Ótimo. Mas é aconselhável manter
uma bula como essa fora do alcance
das crianças.
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