São Paulo, quarta, 24 de março de 1999

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CIRANDA FINANCEIRA

A "ciranda financeira" designava, nos anos 80, a engrenagem em que a dívida pública era peça decisiva. Mas hoje, mesmo com inflação baixa, a ciranda continua. É o que revelou o jornalista Celso Pinto, em sua coluna de ontem nesta Folha: voltou a situação que existia sob a hiperinflação.
A engrenagem gira em torno da dívida pública. No período de inflação alta e crônica, esses títulos indexados eram um lastro contra a perda de valor das aplicações financeiras.
Com o tempo, a dívida pública não apenas cresceu, mas passou a ser rolada com juros ainda maiores para evitar que os investidores fugissem, buscando outras aplicações financeiras ou moeda estrangeira.
Depois do real, esperava-se que a dívida pública caísse e que os investidores optassem pela produção.
Mas o que se viu, mesmo com inflação baixa, foi uma enorme dificuldade do governo para reduzir o déficit público. E como a âncora cambial exigia juros altos (para atrair capitais externos), a ciranda ressurgiu.
A emissão de títulos públicos passou a servir para financiar o déficit público e para oferecer um abrigo ao capital especulativo externo que aportava. Novamente, juros altos geraram uma hipertrofia da ciranda financeira centrada na dívida pública.
Os bancos se tornaram intermediários cada vez mais concentrados no giro dessa dívida pública. No final de 1998, os títulos geravam 43% da receita dos bancos estrangeiros enquanto os empréstimos produtivos respondiam por apenas 17%.
É um processo irracional, pois, se não ocorrer uma redução dos juros, haverá um crescimento da dívida pública muito mais rápido que a capacidade de o governo arrecadar impostos, cortar gastos ou privatizar para pagar aos que "investem" na ciranda.
Se se chegar a esse ponto, ficará claro o sentido da "ciranda". Como nas festas infantis, não há lugar para todos e o jogo prossegue se o disco toca. Mas, se a música parar, ao contrário dessas festas, haverá uma corrida em que muitos se machucarão.



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