São Paulo, segunda-feira, 24 de abril de 2006

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JOÃO SAYAD

Ideologia

A privatização deu certo?
Os investimentos não aumentaram, como se esperava. No setor elétrico, tivemos o apagão. Na América Latina, a privatização do abastecimento de água só criou problemas. No Brasil, a Sabesp estatal funciona como uma sociedade anônima privada e vai bem.
A Telebrás havia ligado o Brasil inteiro. Faltavam telefones porque: a) a tecnologia era diferente da atual e b) os recursos para investir eram obrigatoriamente aplicados em títulos públicos por causa do controle do déficit público.
As estatais foram criadas para fazer investimentos antecipados em setores da economia que determinariam o destino do resto da economia.
A Companhia Siderúrgica Nacional é o melhor exemplo -fundada quando a siderurgia ainda era controlada por grandes empresas americanas e o Brasil ainda não tinha um mercado industrial desenvolvido.
Também é o caso do setor elétrico. A oferta de eletricidade antecedeu a demanda e era condição necessária para a industrialização, que apenas se iniciava. Não podia ser deixada a investimentos privados.
Ninguém do setor privado quis investir na Embraer quando foi concebida, apesar da experiência que tínhamos na produção de aviões pequenos.
Aliás, o setor elétrico foi estatizado pela falta de investimento das companhias privadas, assim como aconteceu com o setor de telefonia. E ambas as estatizações ocorreram no início do governo militar.
Setores de ponta -por causa da tecnologia ou porque são instalados à frente da demanda- acabam sendo dominados por empresas verticalizadas ou por empresas estatais.
Nos Estados Unidos, o computador aparece com a construção da primeira bomba atômica. O setor aeroespacial é estatal. A internet começa com os militares. Assim como a televisão internacional, cujo público inicial eram os soldados americanos no exterior. Na Europa, atrasada tecnologicamente em relação aos Estados Unidos, o setor de aviões era um setor de ponta, vide o caso do Concorde.
Na América Latina, atrasada tecnologicamente em relação ao resto do mundo, siderurgia e telefonia eram setores de ponta quando se iniciaram -e tinham que começar como investimentos estatais .
A empresa estatal funciona mal, porque usa regras da administração pública -com concorrências complexas até para comprar um aparelho de ar condicionado. Está sujeita a pressões políticas e, depois, ao corporativismo.
Mas é a alternativa para realizar investimentos à frente da demanda e com riscos que o setor privado não aceitaria. Não é uma opção ideológica. Quando o setor cresce e se consolida, pode ser privatizado. Hoje, somos grandes produtores de aço, e a siderurgia é um setor consolidado. Temos um parque produtor de energia elétrica instalado, e as decisões privadas agora são decisões na margem. Os setores estavam maduros para ser privatizados.
O assunto é página virada. Mas, na semana passada, comemoramos a auto-suficiência na produção de petróleo -depois de meio século de investimentos.
A Petrobras é uma empresa estatal que funciona como uma sociedade anônima multinacional. É estatal ou privada? A resposta não faz a menor diferença.


João Sayad escreve às segundas-feiras nesta coluna.
@ - jsayad@attglobal.net


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