São Paulo, quarta-feira, 24 de maio de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tendências/Debates

Um começo para eleições limpas

MOREIRA FRANCO

O PRESIDENTE LULA sancionou o projeto de lei sobre as novas regras eleitorais. No fundamental, é o substitutivo que apresentei na Câmara dos Deputados ao projeto do senador Jorge Bornhausen, que avança na definição de controle das doações e despesas de campanha. O presidente vetou quatro artigos.


Se adotadas, as medidas propostas configuram um ambiente coercitivo aos que insistirem na prática de ilícitos financeiros


Um, com inteira razão, pois proibia o uso de imagens gravadas fora de estúdio e de arquivo. Os outros três não desfiguraram a proposta original. Lamentavelmente, Lula não vetou o dispositivo que proíbe a divulgação de pesquisas de opinião nos 15 dias que antecedem o pleito. Mas o Supremo Tribunal Federal, creio, não permitirá tal abuso à liberdade de imprensa. Os Poderes Legislativo e Executivo, com morosidade, cumpriram seu papel. E começam a dar respostas ao clamor da sociedade por práticas eleitorais compromissadas com sólidos princípios morais e éticos. Tenho certeza que o Tribunal Superior Eleitoral adotará, ainda nesta eleição, a maioria das regras de procedimentos de despesa, prestações de contas e controle nele definidos. Afinal, eles não regulam o processo eleitoral, mas sim explicitam formas de agir segundo regramentos que já constam da legislação eleitoral em vigor. Os comentaristas políticos insistem, no entanto, em afirmar que a mecânica proposta não cerceia o uso do caixa dois nem trata de restringir as lambanças cometidas nas duas últimas eleições. Dizem que só restringem alguns gastos eleitorais. Ledo engano. Se adotadas, as medidas propostas configuram um ambiente coercitivo aos que insistirem na prática de ilícitos financeiros. Só para relembrar, a diminuição dos gastos é evidente com a vedação do uso das camisetas, brindes, outdoors, showmícios, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagens ao eleitor. Sobre os dispositivos que se destinam a penalizar o caixa dois, destaco a norma "Delúbio": agora o tesoureiro não será o único responsável pelas tramóias. O candidato responde solidariamente pelas contas da campanha com o tesoureiro. Além disso, o artigo 23 da lei determina a existência de uma única conta bancária para receber doações e efetuar pagamentos. As doações só poderão ser feitas por cheques cruzados e nominais, transferências eletrônicas de depósitos e, quando em dinheiro, com depósitos identificados. A punição para os que desrespeitarem as regras será mais severa. Se as contas não forem aprovadas, comprovando abuso do poder econômico, a lei prevê cassação do registro da candidatura ou do diploma, caso já tenha se dado a posse. Atualmente, a legislação prevê apenas o cancelamento do fundo partidário, no ano seguinte à eleição. A ação da Justiça Eleitoral torna-se mais rápida: no prazo de oito dias, os tribunais julgarão as contas dos políticos eleitos e não mais as de todos os candidatos. A lei também determina que as prestações de contas dos candidatos serão apresentadas pela internet, ao longo do processo eleitoral, e não mais 30 dias após o término do pleito. E o Congresso fixará, por lei, um limite de gastos para os cargos em disputa, respeitando a realidade socioeconômica dos Estados. Outra norma moralizadora e que foi adotada em virtude dos excessos cometidos nas eleições municipais de 2004 é a que proíbe, no ano em que se realizar o pleito, a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da administração pública. Excetua-se, é evidente, os casos de calamidade pública ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. Fiscalizar e acompanhar o cumprimento desta nova regra ficou a cargo do Ministério Público. O projeto, repito, foi um grande avanço e contempla o objetivo de inibir os abusos do poder econômico, do uso do caixa dois e, o que é também importante, assegura mais transparência na prestação de contas. A lei, por certo, ainda não é a reforma eleitoral e partidária que a sociedade clama. Mas é uma iniciativa corajosa que permite punir os aventureiros que insistem em "comprar" os seus mandatos para -sem compromissos democráticos, republicanos e éticos- conspurcarem o parlamento e a prática política do país.
WELLINGTON MOREIRA FRANCO , 61, é deputado federal pelo PMDB-RJ e presidente da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara. Foi governador do Estado do Rio de Janeiro (1987-1991).


Texto Anterior: Tendências/Debates
Oded Grajew: Oportunidade desperdiçada

Próximo Texto: Painel do leitor
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.