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São Paulo, terça-feira, 24 de junho de 2003

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CLÓVIS ROSSI

Somos todos delinquentes

SÃO PAULO - À primeira vista, faz todo o sentido a teoria de Catherine Coles, da Universidade Harvard, de defender a punição dos pequenos delitos como forma de evitar que os grandes proliferem.
É esse, de resto, o embasamento teórico do programa "tolerância zero", bem-sucedido em Nova York e em outras partes dos EUA.
No Brasil, no entanto, aplicar "tolerância zero" aos pequenos delitos levaria tanta gente para a cadeia que não haveria espaço para todos.
Por estas bandas, somos quase todos delinquentes, pelo menos pequenos delinquentes.
Usar o acostamento, por exemplo, para furar a barreira do congestionamento nas estradas é um esporte de difusão maciça no Brasil.
Mas aquele que o comete acha que está sendo um grande esperto, não um pequeno criminoso.
Outro exemplo é a montanha de microfirmas com endereço em cidades do interior de São Paulo que cobram ISS (Imposto sobre Serviço) inferior ao da capital. Aposto que, entre os profissionais liberais que abriram firmas em endereço fictício, há muitos que são os primeiros a encher a boca para criticar a corrupção.
Mas cometem o delito de dar um endereço falso, com o que deixam de pagar o imposto na cidade em que vivem, trabalham e, por extensão, consomem serviços públicos.
Desde quando somos quase todos pequenos criminosos é uma questão aberta. Haverá quem diga que foi sempre assim, em um país colonizado por degredados e muitos delinquentes (grandes ou pequenos).
Outros preferem achar que a culpa é dos sucessivos maus exemplos vindos de cima, que foram contaminando quase todos nós.
Qualquer esquema de tolerância zero terá de começar com cada brasileiro deixando de tolerar seus próprios pequenos pecados (os grandes pecadores são incomovíveis).


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