São Paulo, quarta-feira, 24 de julho de 2002

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ANTONIO DELFIM NETTO

Política fiscal e juros

Na sua palestra aos investidores feita em 11 de julho em Nova York, o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, procurou tranquilizá-los com relação à dinâmica da dívida interna, que está em torno de 56% do PIB. Seu argumento mais importante foi que o esforço adicional de superávit primário, que passou de 3,5% para 3,75% do PIB, será mantido (com apoio de todos os partidos) em 2003, como dispõe a Lei de Diretrizes Orçamentárias aprovada no Congresso.
Atribuindo a volatilidade cambial à descrença do mercado de que o país já tenha maturidade política suficiente para distinguir as políticas econômicas virtuosas das aventuras voluntarísticas, Armínio manifestou sua confiança em que, com qualquer candidato eleito, a orientação da política econômica seja basicamente a mesma: manutenção do sistema de metas inflacionárias, implacável perseguição do superávit primário e taxa de câmbio flutuante. Tão logo, portanto, sejam superados os naturais incidentes dos processos eleitorais, o Brasil voltará a um círculo virtuoso como o vivido a partir de 1999, até que a "barbeiragem" do racionamento de energia se manifestasse. Afinal, com uma redução do juro real e uma aceleração do crescimento econômico (ambos antecipados por ele), o esforço fiscal seria suficiente para estabilizar a relação dívida/PIB, eliminando uma das mais graves preocupações dos credores.
O fato interessante é que, depois de quatro meses, a taxa Selic foi reduzida de 18,5% para 18% -em 17 de julho, uma semana após sua palestra. Comparando a Selic de dezembro de 2000 com as taxas de juros de curto prazo de 25 países listados pelo JP Morgan, vemos que o Brasil é um dos três que não a reduziram no período. Relativamente ao Chile e ao México, temos:
O resultado é chocante! Quando lembramos que as melhores expectativas de inflação para 2002 são de 6% para o Brasil, 2,4% para o Chile e 4,6% para o México, temos estas taxas de juros reais, grosseiramente estimadas:
Juntamos ao quadro a informação sobre o crescimento real estimado dos países. Ele revela nossa tragédia e a preocupação dos credores, pois nossos números exigem um superávit primário de 4,5% a 5% do PIB, e não de 3,75%. Com a terrível herança deixada pela política econômica do primeiro mandato, como convencer os investidores de que os efeitos da "volatilidade" criada pelo jingle do PSDB ("não quero ser Argentina") serão passageiros? É preciso, entretanto, insistir: o Banco Central não é culpado. Sem uma sólida situação fiscal percebida e antecipada pelos credores, nem um banco central "independente" pode fixar com "independência" uma taxa de juro real civilizada...


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

dep.delfimnetto@camara.gov.br



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