São Paulo, quarta-feira, 24 de julho de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Inovação, ciência, universidade e empresa
ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE
Ou melhor, de pouco ou nada adianta forçar a universidade a produzir inovação se a indústria no Brasil não estiver preparada para usá-la. Além do mais, sem os valores apropriados, a universidade não tem a motivação e dificilmente desenvolverá competência para assumir uma responsabilidade maior com relação à inovação, embora possa vir a ser um assessor importante, porém secundário. Logo, é essencial que a universidade não abandone seus objetivos, que são a geração, a preservação, a organização e a difusão de conhecimento. Já nos anos 60, foram realizados levantamentos nos EUA sobre que empresas adquiriam tecnologia de universidades, de instituições de pesquisas e de outras empresas. Verificou-se que aquelas que possuíam departamentos de pesquisas e desenvolvimento eram as que adquiriam tecnologia. Ou seja, não são as carentes em tecnologia, mas as que já dela dispõem -para incorporar uma inovação, é preciso ter uma certa capacitação tecnológica. Portanto, se o setor industrial brasileiro nem inova, nem encomenda tecnologia a universidades e instituições de pesquisas, é porque este setor da economia nacional não realiza pesquisas. E por que a indústria brasileira não realiza pesquisas em proporções compatíveis com suas próprias dimensões? É possível que seja devido, em parte, a condições históricas da época em que um excessivo protecionismo abrandava a necessidade de um maior esforço em desenvolvimento tecnológico, como pretendem os adeptos do comércio livre. Entretanto não restam dúvidas de que as empresas multinacionais, ao carrear instruções, verdadeiras receitas para aplicações de tecnologias já estabilizadas, elaboradas em suas matrizes, para o processo produtivo em suas filiais, dispensam qualquer esforço de desenvolvimento tecnológico próprio, inclusive interações e eventuais contratações de pesquisas em instituições nacionais. Mais, impõem aos seus fornecedores condições que os induzem a optar por tecnologias desenvolvidas no exterior. É verdade que os atuais fundos setoriais exigem do setor produtivo investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Não obstante, com poucas exceções, as empresas multinacionais têm preferido fazer uma "doação" desses recursos a universidades e outras instituições a realizar pesquisas próprias, o que, em princípio, derrota o propósito mais abrangente desses fundos. E a maior ameaça é que venham as universidades e institutos a ser usados para, com esses recursos, realizar serviços de rotina ou pesquisas periféricas, que não se fariam na universidade não fosse pela remuneração. Por outro lado, também não seria razoável violentar a natureza das multinacionais, forçando-as a criar setores de pesquisa. A única solução é, portanto, transferir para a empresa cuja matriz é localizada em território nacional pelo menos parcela apreciável dos recursos dos fundos setoriais, para que implantem autênticos departamentos de pesquisas e desenvolvimento. A nova Lei da Inovação permite essa transação. Só falta coragem para enfrentar as multinacionais. Rogério Cezar de Cerqueira Leite, 71, físico, é professor emérito da Unicamp e membro do Conselho Editorial da Folha. Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Liliana Buff de Souza e Silva: Anatomia de um sequestro Índice |
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