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JOSÉ SARNEY
Que cargo...
Depois que a evolução política da humanidade criou o
presidencialismo como uma
das mais altas conquistas da
democracia, a eleição presidencial passou a ser o mais
importante evento do exercício democrático.
O voto é a síntese de toda
construção que se processa no
sistema político. Uma eleição
presidencial é uma soma de
ambições, que vão das mais
legítimas até a do poder partidário, que se resume no direito de proporcionar mandos
menores.
Nas democracias pobres essa escolha é uma guerra que
mais parece uma luta de vale-tudo. No Brasil já tivemos vários exemplos desse jogo sujo
e ainda 80% da disputa giram
em torno de julgamento pessoal. Um escândalo é o mais
ambicionado objetivo de uma
campanha presidencial.
Hoje, já aparecem para camuflar a luta presidencial algumas "propostas" pontuais,
sem ainda aparecer nenhum
programa sistêmico.
Mesmo nos Estados Unidos,
berço do presidencialismo,
com partidos históricos e consolidados, a disputa ainda tem
muito de pessoal e de métodos
condenáveis, sem excluir retórica suja.
Mas o cargo em si, e não a
disputa, tem sido motivo de
muitos estudos e análises,
desde a "presidência imperial" dissecada por Arthur
Schlesinger até "The American Presidency", de Clinton
Rossiter, onde este sustenta "a
veneração, a reverência, a autoridade e a dignidade" que o
cargo possui.
A verdade é que todos os
meios de controle da Presidência não foram capazes de
lhe retirar a força e a autoridade absoluta, a magia que exerce sobre a sociedade.
Seu poder vai além do cargo, da pessoa, dos seus objetivos políticos, para invadir um
campo de mando e um caminho para a história que, com
o tempo, junta a todos num
simbolismo da continuidade
nacional.
Por isso a disputa é, despojada das circunstâncias do
tempo em que ocorre, um momento quase sagrado na vida
das nações democráticas.
Poder realizá-las como rotina é um avanço na história de
um povo. Nenhum país pode
ser potência econômica, militar, científica, cultural se não
for uma potência institucional
capaz de constituir seu autogoverno.
A periodicidade dos mandatos foi outra descoberta
marcante na história dos regimes democráticos. Sem ela
não existiria democracia.
Plácido Castelo, que foi governador do Ceará, numa imagem bem popular e sertaneja,
dizia: "O poder democrático é
uma caneta. Com ela se pode
fazer tudo. Felicidade e infelicidade. Mas, no dia em que
acaba a tinta, vai-se embora...
A eleição é a tinta nova."
E de novo as esperanças renascem, porque só o homem
sabe o que é esperança e dela
vive.
JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta
coluna.
jose-sarney@uol.com.br
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