São Paulo, quarta-feira, 24 de novembro de 2010

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Ataques no Rio

Reações de traficantes à política de segurança do Estado não podem intimidar autoridades, que precisam persistir no combate ao crime

Em "Cidade de Deus" (2002), a narrativa sobre a violência no Rio recobre um arco que vai do banditismo convencional da década de 1960 ao triunfo das quadrilhas de traficantes fortemente armadas nos anos 1980. A obra cunhou uma linguagem, inaugurou um subgênero e inspirou seguidores.
O mais bem-sucedido é o fenômeno popular "Tropa de Elite", que, em dois episódios, enfoca a tentativa de enfrentamento policial-militar do tráfico e o avanço das milícias nas favelas cariocas, em meio à corrupção de agentes de segurança e políticos.
A mais recente investida do Estado do Rio contra o narcotráfico foi a instalação de Unidades de Polícia Pacificadora, as UPPs, em áreas que eram dominadas por narcotraficantes. O projeto de reocupar territórios tomados pelo crime baseia-se em policiamento permanente, oferta de serviços e ações de promoção da cidadania.
As favelas das UPPs ainda não foram transportadas para as telas de cinema, mas já inauguraram um novo capítulo na história dos conflitos entre forças de segurança e banditismo na cidade.
Nos últimos dias, uma onda de arrastões, assaltos e automóveis incendiados sacudiu o Rio. O vandalismo foi, ao que tudo indica, orquestrado por marginais com o intuito de assustar a população e intimidar autoridades.
De um modo geral, as explicações convergem para o que seria uma reação de quadrilhas e facções unidas contra a ofensiva do Estado. A perda de pontos de venda de drogas, a política de enfrentamento implantada pelo governo e o deslocamento de líderes do tráfico para o presídio federal de Catanduvas (PR), onde encontram mais dificuldades para comandar suas operações, seriam as causas da revolta e dos atos "terroristas" -semelhantes aos que tiveram lugar em São Paulo, em 2006.
Não há dúvida de que o caminho é perseverar, ampliar a presença da polícia nas ruas, avançar com as UPPs e ir ao encalço dos responsáveis pelos ataques -e não apenas da arraia miúda.
São imensas no entanto as dificuldades a superar, desde a carência de efetivos e recursos policiais à extensão e à profundidade que o problema adquiriu.
Por ora, a "pacificação" promovida pelo governo, elogiada e reconhecida pela população, circunscreve-se a áreas relativamente pequenas, contíguas a bairros nobres e de classe média do Rio -a cidade turística da zona sul.
Muitos dos marginais atingidos deslocam-se para regiões mais afastadas, entre as quais os grandes "complexos" de favelas, como o do Alemão, as principais cidadelas do narcotráfico.
Ocupá-las é um grande desafio, que exigirá intenso preparo das autoridades do Estado e apoio do governo federal. Mas não há outra alternativa, caso a capital olímpica de 2016 queira mostrar ao país e ao mundo não mais cenas de guerra, mas os seus conhecidos cenários cinematográficos -sem risco de balas perdidas.


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