São Paulo, domingo, 24 de dezembro de 2006

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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

Sinfônica Heliópolis

VOU INTERROMPER a série de artigos que vinha publicando sobre as reformas estruturais para dizer aos meus leitores que ganhei, neste Natal, o melhor presente de minha vida.
Tive a rara felicidade de assistir a dois concertos da Sinfônica Heliópolis, formada por jovens carentes e que, com uma oportunidade de estudo, tornaram-se verdadeiros virtuoses em seus instrumentos.
Heliópolis é a maior favela de São Paulo, surgida na década de 70.
Quarenta por cento das casas não têm esgoto e 60% das ruas não têm asfalto. Centenas de famílias moram em barracos improvisados. As organizações sociais fazem o que podem para aliviar o sofrimento daquela gente.
Estive pela primeira vez naquela comunidade em 1986. A população chegava a 100 mil habitantes. Hoje são mais de 120 mil. Ali vivem cerca de 60 mil crianças de sete a 14 anos.
A maioria estudando em condições precárias.
Há dez anos surgiu a idéia de formar entre os jovens uma orquestra sinfônica. Poucos acreditaram nesse sonho. A maioria sugeriu distribuir tamborins, reco-recos, zabumbas etc. -que, segundo o senso comum, é a única vocação da juventude carente.
Deus orientou as lideranças para um outro caminho. Alugou-se um galpão; compraram-se os instrumentos; contrataram os professores que, sob a orientação dos dedicados e competentes maestros Silvio Baccarelli, Roberto Tibiriçá e Edilson Ventureli, puseram a criançada a aprender os vários instrumentos da orquestra.
Foram dez anos de trabalho. O resultado aí está. A Orquestra Heliópolis acompanhou de maneira magistral o grande pianista Arnaldo Cohen em dois concertos, realizados na semana finda, nos teatros municipais de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Foram duas noites memoráveis.
A orquestra manteve o mais alto padrão. Os jovens incorporaram a música em suas almas. Todos tocam com amor e exibem aos ouvintes as milhares de horas de estudo que dedicaram para chegar aonde estão.
Está aí o milagre da educação.
Gente sem recursos, beirando a zona dos grandes riscos sociais, abraçou a música para deixar o submundo para trás. Um dos músicos, Adriano Costa Chaves, 18 anos, contrabaixista, ganhou uma bolsa de estudos e já integra a Orquestra Filarmônica de Israel sob a batuta do grande maestro Zubin Mehta que esteve em Heliópolis, regeu a orquestra e se emocionou ao constatar o quanto pode ser feito quando se prepara os jovens adequadamente.
Cumprimento todos os responsáveis por esse belo projeto e sugiro aos leitores que não percam as futuras apresentações desse fabuloso conjunto sinfônico. Feliz Natal!

antonio.ermirio@antonioermirio.com.br


ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES escreve aos domingos nesta coluna.


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