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CARLOS HEITOR CONY
De Proust a Agnaldo Timóteo
RIO DE JANEIRO - O amigo admite: "Eu fazia um péssimo juízo de mim
mesmo. Julgava-me um idiota desde
os 15 anos, quando tentei ler Proust.
Nunca ia além da página 50 ou 60.
No Carnaval passado, decidi fazer
uma higiene mental, apanhei o
Proust e, maravilha, devorei os sete
volumes, devagarinho. Agora posso
me olhar no espelho".
Milhares de leitores tiveram experiência igual: forçaram a barra antes
do tempo e empacaram. É preciso
que tenha acontecido poucas e boas
em nossa vida pessoal.
Pensando bem, o caso de Proust,
com variantes, pode ser aplicado a
qualquer autor que tenha se dedicado aos labirintos do homem. Machado de Assis me vem logo à memória.
Pulando de Proust e Machado para
autores mais atuais, gostaria de falar
em Agnaldo Timóteo, que não chega
a ser autor, embora seja de sua autoria um episódio que escandalizou a
nação. Ao estrear na tribuna da Câmara dos Deputados, em Brasília, faz
tempo, creio que uns 20 anos, foi pichado por editoriais e cronistas da
grande imprensa. Chegaram a falar
em falta de decoro parlamentar, em
necessária cassação de seu mandato.
Não votara nele, mas curti adoidado sua ida à tribuna, com telefone à
mão, pedindo a bênção de sua mãe
para o instante em que inaugurava
um momento que ele julgava importante em sua trajetória individual.
O presidente da Casa (não lembro
quem era) espinafrou-o soberanamente, baseado no regimento interno. De minha parte, fiquei emocionado com o espalhafatoso cantor de voz
possante, repertório cafona, menino
pobre que deu duro para chegar a algum lugar.
Ele prestou, à sua maneira, homenagem ao Poder Legislativo e ao ofício de deputado, que andavam por
baixo. Havíamos atravessado anos
de arbítrio e, com as exceções de praxe, o Legislativo habituara-se às humilhações do Executivo.
De repente, um homem simples é
eleito, vai à Câmara e seu primeiro
gesto é pedir a bênção de sua mãe.
Senti que alguma coisa ficou faltando em Proust e em Machado de Assis.
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