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MEDO DE CRESCER
O medo de crescer é uma fobia
típica de autoridades monetárias. Em países como o Brasil, sob o
monitoramento do Fundo Monetário Internacional, soma-se à cautela
monetarista uma perversa transferência de renda para os setores beneficiados pela ciranda financeira.
Nos últimos meses, as contas públicas produziram superávit. Pressões de custo foram absorvidas pelo
sistema de preços. A taxa de câmbio
sofreu desvalorização, refletindo o
mau desempenho das exportações
brasileiras. Nem assim a inflação
tornou-se ameaçadora.
Em condições normais, um governo aproveitaria esses progressos para reduzir mais os juros e implementar políticas de desenvolvimento. A
equipe econômica do governo Fernando Henrique Cardoso, encabeçada por Pedro Malan e Armínio Fraga,
não pensa assim. Como os fatos dificultam a justificação do seu conservadorismo, as autoridades voltaram
a criar fantasmas ideológicos e a elaborar conceitos supostamente complexos de macroeconomia.
A prática foi ao paroxismo com
Gustavo Franco, que chegou a produzir textos de entonação acadêmica
sobre o "atraso bananal" como resposta aos críticos do atraso cambial.
Com Francisco Lopes, o hábito teve
um momento surrealista, com a
"banda diagonal endógena". Com
Armínio Fraga, a imaginação endereça-se para a noção de "produto potencial". O Banco Central já programa seminário internacional sobre o
tema. Muita tinta já foi gasta para
tentar dar objetividade ao mito de um
"teto" para o crescimento.
Na tradição monetarista, toda a sofisticação serve no final ao imperativo de facilitar a gestão do "statu quo"
e de imobilizar políticas de desenvolvimento econômico. Em uma de
suas versões mais populares, essa
ideologia econômica imagina que
"forçar" o crescimento, desequilibrando o mercado de trabalho, traria
pressões salariais e, portanto, levaria
mais à inflação do que a um crescimento real da economia.
É uma visão estática dos mercados.
Afinal, o crescimento sustentável
não é o que gera pressões insuportáveis de demanda, mas o que induz,
com planejamento e investimentos
estratégicos, aumentos da oferta de
bens, serviços e competências. O
monetarista, no entanto, tem horror
ao planejamento, vê na ação do Estado apenas uma indução à corrupção
e aos desperdícios.
Pior, apesar de querer basear-se em
pesquisas empíricas, o monetarista
sempre prefere suas teorias quando
elas são contrariadas pelos fatos.
Nos EUA, por exemplo, fracassaram
as tentativas de fazer política econômica com metas monetárias. Mais
recentemente, a relação supostamente estável entre crescimento e inflação, superada pela realidade do
crescimento prolongado, colocou
em xeque os ortodoxos.
No Brasil, infelizmente, os discípulos dessa ideologia econômica costumam ser mais fervorosos que seus
próprios mestres. Neste momento,
em que ganha força na sociedade a
consciência de que não basta a estabilização sem desenvolvimento, os
herdeiros do monetarismo procuram resistir, com medo de crescer.
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