São Paulo, sexta-feira, 25 de março de 2011

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De volta ao futuro

STF decide, enfim, que Ficha Limpa só vale para 2012, mas deveria reavaliar também a questão constitucional da presunção de inocência

O STF (Supremo Tribunal Federal) retomou finalmente o julgamento da Lei da Ficha Limpa. Tratava-se de decidir se os efeitos da lei deveriam mesmo ter tido validade já nas eleições gerais de 2010. A questão estava empatada desde o ano passado.
Com o voto do ministro Luiz Fux, o Supremo estabeleceu por 6 a 5 que a Ficha Limpa só deve vigorar a partir das eleições municipais de 2012. Era a decisão mais correta a tomar.
Prevaleceu a letra do artigo 16 da Constituição, segundo o qual "a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência". A Ficha Limpa foi promulgada em junho de 2010, portanto era incontornável que seus efeitos ficassem para o pleito subsequente.
Não se pode, porém, responsabilizar só o STF pela confusão instalada. Lembre-se, em primeiro lugar, que a cadeira ora ocupada por Fux estava vaga desde agosto de 2010, quando Eros Grau se aposentou. Para além dessa circunstância, porém, que cabia ao presidente da República resolver, há um problema de fundo na lei.
A legislação nasceu de iniciativa popular, o que por si já é um fato positivo. Criou-se, durante a tramitação do projeto no Congresso, uma enorme expectativa social de que o país contaria, enfim, com um instrumento para expelir notórios corruptos da política, objetivo mais que desejável.
Nada é tão simples, contudo. A Justiça não deve submeter-se ao clamor popular, ainda que permanecendo sensível a ele.
Votada de forma açodada pelo Congresso, já no calor da disputa eleitoral, a Ficha Limpa tal como aprovada -bastando uma condenação em decisão colegiada para sujar a ficha do candidato- suscita questionamento sério sobre sua constitucionalidade, a começar do princípio da presunção da inocência. Como já se defendeu neste espaço, o mais recomendável seria seguir o princípio de condenações transitadas em julgado.
Para o mais novo membro do STF, Luiz Fux, a Ficha Limpa é "a lei do futuro". Seu voto, ainda que contrário à vigência imediata, implica claro apoio ao objetivo central da iniciativa popular.
Não se exclui, no entanto, a hipótese de que o Supremo venha a rediscutir, nas decisões futuras sobre cada caso, o escopo de aplicação da lei, firmando jurisprudência sobre as situações específicas em que a ficha do candidato pode ser carimbada como "suja".
Abre-se agora novo capítulo da novela político-judicial, que parece ainda longe do fim. Mesmo que um reexame da questão de fundo da presunção de inocência possa acarretar alguma insegurança jurídica adicional, até outubro deste ano há espaço para o STF aprofundar o debate, em tempo para o pleito de 2012.


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