São Paulo, segunda-feira, 25 de setembro de 2006

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JOÃO SAYAD

História

HISTÓRIA é acaso, liberdade e predeterminação.
Às vezes, mudanças suaves e silenciosas transformam o mundo sem que ninguém perceba. Só mais tarde os historiadores convencionam data e evento para marcar o início de uma nova época. A Idade Média, nos livros-texto, por exemplo, começa com a Queda do Império Romano; a Idade Moderna, com a Queda de Constantinopla. Romanos e bizantinos sentiram um certo desconforto, mas nunca souberam que estavam vivendo uma nova época.
Data e evento são como as placas nas estradas de São Paulo que indicam: "Aqui passa o Trópico de Capricórnio". Saímos da zona tropical e entramos na temperada, mas o clima não muda por causa das placas. A diferença só é perceptível milhares de quilômetros depois.
Nestes casos, os personagens do drama histórico -o último imperador de Roma ou Manuel Paleólogo de Bizâncio- são apenas marionetes manipuladas pelo sistema, pela estrutura ou por qualquer outra coisa. Segundo alguns filósofos, Napoleão foi apenas marionete, embora loucos com mania de grandeza não saibam disto.
Outras vezes, a história é feita de sorte, de azar e de atos de liberdade e poder. São os casos da sobrevalorização cambial entre 94 e 98 e das taxas de juros de agora. Um agente de personalidade e vontade faz a história.
Bush, ao reagir atabalhoadamente ao 11 de Setembro, concorre na categoria Napoleão, marionete da tendência inaugurada pelo alucinado Bin Laden, este, sim, protagonista autônomo da história.
O problema é conhecido dos teólogos. Como é possível afirmar que o homem seja livre e capaz de fazer história se existe um Deus, onisciente e onipotente, que sabe exatamente o destino (a tendência) de cada um de nós?
É prematuro afirmar que a semana passada, a dos dossiês, tenha sido histórica. Os editoriais do "Estado" descreviam o governo de JK como o fim do país, por causa da corrupção e da inflação. Para nós, os anos JK foram anos dourados.
Se a semana passada foi histórica ou não, só interessa aos historiadores. Para os brasileiros adultos e vivos na semana passada, ela foi definitivamente histórica. Desafortunadamente, é quase certo que o ocorrido resulte de uma tendência e de um sistema organizado para fazer política truculenta e anti-republicanamente. Os personagens com nomes estranhos são marionetes pegas por azar.
A questão é saber se inauguramos uma nova era pior do que a anterior. Ou se os acontecimentos foram singulares e sem repercussão. Esperamos aflitos a resposta que virá para o início do ano que vem.
jsayad@attglobal.net


JOÃO SAYAD escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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