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RUY CASTRO
Americanizada
RIO DE JANEIRO - Por causa do
centenário de Carmen Miranda, no
próximo dia 9, não tenho chegado
para os pedidos de entrevistas sobre a "Pequena Notável". Uma pergunta recorrente se refere ao gelo
que certa plateia do Cassino da Urca lhe deu em 1940, quando ela voltou de férias ao Rio, depois de um
ano de gigantesco sucesso nos EUA,
e aceitou fazer um show beneficente para dona Darcy, mulher do ditador Getúlio Vargas.
Carmen entrou no palco e, em
vez de seu costumeiro "Alô, macacada!", soltou um "Hello, people!".
E cantou o fox-rumba "South American Way", que continha um único
verso em inglês -justamente o verso-título. Por causa disso, a plateia a
gelou e a acusou de ter voltado
"americanizada". A pergunta dos
repórteres traz sempre um travo de
condenação. De há muito, ficou feio
ser "americanizado".
Mas, em 1940, exceto para os comunas, não havia problema nenhum. Os EUA não eram o país
egoísta, brutal e intervencionista
que se tornaria com a guerra do
Vietnã. Ao contrário, eram o país
dos arranha-céus, dos Cadillacs, da
banana split, de Tyrone Power,
Betty Grable, Bing Crosby, o boxeur
Joe Louis, o presidente Roosevelt.
Sabia-se que, quando entrassem na
guerra, os Aliados venceriam.
Minto. Havia outra categoria que
os detestava: os nazistas. Como os
EUA eram aliados naturais da Inglaterra, Hitler e seus torcedores
não podiam gostar deles. Naquela
noite, na Urca, metade da plateia
era ligada a Getúlio, ainda simpático à Alemanha -ministros e militares fascistas, empresários alemães
(e seus sócios brasileiros) e os puxa-sacos de sempre. Foi essa a plateia
que gelou Carmen. Dois meses depois, ela voltou à Urca e saiu consagrada pelo seu verdadeiro público.
Obama começou bem, mas terá
de rebolar para que o mundo deixe
de detestar os EUA.
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