|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
É correta a decisão do governo venezuelano de não renovar a concessão da RCTV?
SIM
Democratizar a comunicação na Venezuela
JULIO GARCÍA MONTOYA
NESTES ÚLTIMOS dias de maio,
boa parte da imprensa venezuelana e internacional concentrou seus esforços em tratar de expor ao mundo os sinais que indicam o
caminho pelo qual transita a revolução bolivariana na atualidade.
Alguns meios têm feito até um trabalho conjunto, um consórcio de interesses da mídia privada, para demonstrar a influência que a política
externa venezuelana teve em certas
decisões de países sul-americanos.
Esse desdobramento operativo da
mídia indica, primeiro, o impacto que
nosso processo de mudanças políticas estruturais tem na consciência
dos donos desses meios e a preocupação que gera em seus financistas. Depois, o alcance que nossas decisões
políticas tiveram no concerto de necessidades e propostas de mudança
que se gera continentalmente.
A Venezuela não está fazendo nada
que não deva ser feito para obter o
que há muito merece e lhe foi negado
sistematicamente: o controle real sobre seu destino soberano. E entendemos que isso preocupe os impérios.
As decisões e ações empreendidas
pelo governo bolivariano para devolver ao povo os bens sociais que lhe
pertencem por direito constitucional
e reafirmar com isso sua condição de
povo soberano são um avanço para o
cumprimento de um clamor continental: a democratização da sociedade e o conseqüente resgate da condição de cidadania que foi seqüestrada
do indivíduo latino-americano.
O povo venezuelano viveu afastado
por anos de sua cidadania. A sociedade política elitista e a grande mídia
nacional trabalharam para convertê-los em simples consumidores, injetando o vírus do consumismo e afastando os valores que reforçam a identidade nacional, a vida em comunidade e a necessária e saudável solidariedade humana. Isso -quem pode negá-lo?- é uma deformação insana.
Agora, quando o governo venezuelano decide corrigir esse mal para o
bem da sociedade, se levantam algumas vozes de condenação, muitas delas impulsionadas pela ignorância,
produto precisamente desses longos
anos de distorção da mídia, e outras
tantas motivadas pelo temor de que
possam ficar em evidência suas práticas antiéticas, imorais e desumanas.
Esse tipo de situação se evidencia
na manipulação que constantemente
fazem os meios com seus conteúdos.
Aqui, por exemplo, pergunta-se se é
correta a decisão venezuelana de não
renovar a concessão da RCTV, premissa já negativa que imediatamente
impõe uma carga de preconceito ao
leitor. Pensem por si mesmos, evitando que o meio os leve pela mão como
meninos, quão diferente seria se a
pergunta fosse: é correta a decisão de
democratizar a comunicação que tomou o governo venezuelano?
Acreditamos não ser difícil colocar
a potência da mídia para informar
corretamente que o que acontece na
Venezuela é um processo de democratização das comunicações. O processo começa por resgatar um bem
público como o espectro radioelétrico, que na Venezuela é virtualmente
monopolizado pelas cadeias televisivas RCTV e Venevisión. Ambas ocupam 90% da banda de transmissão radioelétrica, com concessões estatais
que se tornaram automáticas, que
vencem a cada 20 anos e precisam ser
revisadas e avaliadas para considerar
sua provável renovação ou expiração.
O caso específico da não-renovação
da concessão sobre o espectro radioelétrico ao canal RCTV não é a totalização desse processo e, além disso, trata-se apenas do exercício de um direito legítimo do Estado venezuelano
sobre um bem público que administra e que tinha sido concedido a um
canal privado por mais de 50 anos.
A liberação do sinal que ocupava a
RCTV servirá para que milhares de
produtores independentes, que nunca tiveram capacidade nas redes privadas de TV, assim como expressões
das comunidades, possam apresentar
suas produções televisivas de qualidade e focadas no resgate dos valores
que enaltecem o povo venezuelano.
Entendemos a resistência da grande mídia transnacional ante esse processo venezuelano, pois nosso governo acaba de dar uma lição: basicamente, está colocando as coisas no
justo lugar, demonstrando que política é terreno do Estado e que os meios
de comunicação social se devem à sociedade que os demanda, e não a seus
exclusivos interesses econômicos.
JULIO GARCÍA MONTOYA, general, é embaixador da República Bolivariana da Venezuela no Brasil.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Andrés Cañizález: Consolidação da hegemonia Próximo Texto: Painel do Leitor Índice
|