São Paulo, segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Próximo Texto | Índice

Herança poluída

Estudo indica aumento de 45% na emissão de gases do efeito estufa entre 1994 e 2005; setor energético cresce mais

NUM PAÍS tão mesmerizado com o curto prazo como o Brasil, basta um estudo com o horizonte de uma década para evidenciar a miopia reinante. Mesmo quando repete o que já se sabe, a mera expressão da realidade em números -como o crescimento de 45% nas emissões de gás carbônico (CO2) do país entre 1994 e 2005- tem o impacto de um pequeno terremoto.
Não é de hoje que especialistas apontam a crescente poluição da matriz energética nacional. Medidas para fazer frente ao apagão de 2001 se concentraram em termelétricas, que queimam combustíveis fósseis (gás natural, óleo ou carvão). Essas usinas são a principal responsável pelo agravamento do efeito estufa, origem do aquecimento global.
Os átomos de carbono dos combustíveis fósseis estavam soterrados nas profundezas do planeta, como hidrocarbonetos. Na queima desses compostos para liberar sua energia química e movimentar turbinas, montanhas de CO2 ganham a atmosfera e adensam o invólucro de gases que dificultam a dissipação do calor próximo da superfície de volta para o espaço.
Um tratado internacional (Protocolo de Kyoto) estipula que países-membros publiquem inventários de suas emissões. Do Brasil só se produziu um até o presente, com dados de 1994. Em preparação para o segundo, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e a organização social Economia & Energia esboçaram um balanço de carbono do país de 1994 a 2005.
O relatório, note-se, não contemplou o desmatamento, principal fonte emissora do país (cerca de 75%, segundo o inventário anterior). Mesmo assim, há motivo de sobra para alarme.
Alguns dos setores mais poluentes aumentaram emissões no ritmo geral e mantiveram sua participação, como indústria (31%) e transportes (40%). Isso já é grave por si, porque em países mais desenvolvidos a tendência é reduzir a intensidade energética e carbônica da economia. Ou seja, produzir mais bens e serviços com menos energia e emissões de carbono. O Brasil segue na contramão, sem dar a devida atenção a eficiência energética, energias alternativas e transporte ferroviário. Nesse aspecto, os governos FHC e Lula se parecem terrivelmente.
O que mais chama a atenção no estudo é o crescimento relativo do setor energético. De 7,6 milhões de toneladas de carbono em 1994, passou a 15,3 milhões em 2005. Sua participação no total foi de 12% a 17%, com decréscimo correspondente da hidreletricidade, que quase não emite gases do efeito estufa.
Somada ao flanco aberto pelo desmatamento, o Brasil vai à reunião de negociação sobre clima em Bali (Indonésia), no mês que vem, em posição frágil. Para assumir o papel de protagonista que a diplomacia nacional se arvora, porém, o país terá de explicitar algum tipo de compromisso concreto -ainda que sejam metas modestas e voluntárias de redução do desmatamento.

Próximo Texto: Editoriais: Mais formal

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.