São Paulo, domingo, 26 de dezembro de 2010

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CAMILA MARQUES

Emergência médica

"Comecei a pagar plano de saúde. Nunca tinha marcado um exame para fazer na semana seguinte, tinha que esperar meses. Mas se eu pago tão caro por uma coisa que o governo antes me dava, posso receber algum trocado de volta?"
A pergunta, feita a mim pela manicure de um salão de beleza do bairro, reúne duas discussões abordadas na Folha. Uma é o poder de compra crescente da nova classe C, que indiscutivelmente ganhou corpo nos oito anos de governo Lula. Outra é a urgência da reforma do sistema de saúde brasileiro, estagnado.
Essa nova classe média, ao ter satisfeita sua necessidade básica e atendido o desejo imediato de consumo, passará a cobrar do governo mais eficiência em outras esferas.
Se a cobrança antiga era o mero atendimento na rede pública -nem a qualidade era primazia, afinal, passar por um médico já era algo difícil de alcançar-, a nova demanda é a regulação de um sistema não só público, mas que inclui os seguros privados.
E é justo neste ponto que persiste o desafio: garantir o acesso ao tratamento universal, hoje insustentável financeiramente, associado aos serviços que os planos particulares têm a obrigação de oferecer, mas de que tanto fogem.
Projeto de lei complementar em São Paulo prevê a possibilidade de cobrar dos planos e seguros os atendimentos dados aos seus segurados nos hospitais estaduais gerencia dos por Organizações Sociais de Saúde (OSS) -25% das vagas seriam para particulares.
Quem é contra argumenta que a medida pressupõe reserva de leitos e fere o princípio de universalidade no atendimento do SUS (Sistema Único de Saúde). Quem defende destaca que essa é a única maneira de tirar do colo do cidadão uma fatura duplicada.
Paguem os planos ou não, o que não se pode é deixar os brasileiros com a prescrição do amargo remédio de bancar a saúde no país, seja por meio de impostos, seja pelas nada baixas mensalidades dos seguros privados.
Na verdade, existe ainda a classe médica, que acaba sofrendo outro efeito colateral. Pois além de ser contribuinte e desembolsar a mensalidade, o médico ainda pode estar no grupo dos duplamente mal remunerados, caso seja atendente na rede pública e/ou filiado a algum convênio.
Afinal, como argumentam, médicos são praticamente obrigados a ter ligação com um plano hoje -uma vez que poucos brasileiros podem arcar com os custos astronômicos de uma internação-, mas recebem pagamentos irrisórios pelos serviços prestados.
Não é à toa que a indicação do ministro da Saúde foi uma das últimas a serem feitas por Dilma Rousseff. O agraciado, Alexandre Padilha (PT), 39, é um médico infectologista es colhido não por sua formação, mas pela reconhecida capacidade política de articulação.

CAMILA MARQUES é secretária-assistente Digital da Folha.


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