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TENDÊNCIAS/DEBATES
O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) representa uma inovação na política econômica?
NÃO
Um remendo chamado PAC
CARLOS EDUARDO SOARES GONÇALVES
DEPOIS DE muitas idas e vindas,
o governo finalmente divulgou
nesta semana o tão alardeado
pacote econômico que, segundo seus
progenitores, irá tirar o Brasil do marasmo do crescimento que nos acompanha há mais de duas décadas. É de
fato bastante incômoda essa posição
de retardatário do crescimento mundial, mormente em período tão favorável para as economias em desenvolvimento. Infelizmente, porém, não
será o PAC que dela nos livrará.
Antes de dizer por que o PAC é insuficiente para destravar a economia
brasileira, é preciso identificar as causas do baixo crescimento, que são, em
grande medida, estruturais, e não
conjunturais. Demandam, pois, reformas, e não pacotes simplistas recheados de marketing.
A pesquisa empírica revela que
nosso pífio crescimento se deve a um
conjunto de fatores que o PAC só tangencia, incluindo: baixo nível educacional da força de trabalho; péssimo
clima para negócios; infra-estrutura
em estado calamitoso; gastos públicos correntes em patamar elevadíssimo; carga de impostos alta e estrutura
tributária ineficiente; tênue garantia
dos direitos de propriedade; e proteção tarifária ainda elevada. Por limitação de espaço, focaremos em alguns
desses verdadeiros gargalos e na sua
relação (ou ausência de) com o PAC.
O pacote consiste, grosso modo, em
algumas reduções de impostos para
setores selecionados (que suscita
uma "escolha de vencedores" por burocratas em Brasília) e em um aumento do investimento público, com
ênfase para a infra-estrutura.
Vale dizer que, em certa medida, o
diagnóstico do governo -é preciso reduzir impostos e melhorar o estado
da infra-estrutura- é correto. Errado
é o remédio proposto: escolher vencedores e aumentar os gastos públicos reduzindo o superávit primário.
Já no que tange à contenção das
despesas correntes, um dos maiores
entraves ao crescimento, pelos seus
efeitos perversos sobre os juros e a
carga de impostos, apenas uma proposta minguada de diminuição da taxa de crescimento dos gastos reais
com os servidores públicos. É muito
pouco para um país em que o setor
público deveria gastar, dada a nossa
renda per capita, na faixa de 20% a
25% do PIB, e não 33%.
Investimentos em infra-estrutura
são mais que urgentes, sobretudo nas
áreas de transporte e energia. Estudos empíricos mostram que cerca de
30% da diferença entre nosso PIB e o
da Coréia se deve à diferença de infra-estrutura. Mais: investimentos em infra-estrutura são fontes geradoras,
"causais", no linguajar dos economistas, de outros tipos de investimento.
Mas isso não significa que o Estado
seja o agente mais apropriado para fechar essa lacuna. Uma solução mais
inteligente que a apresentada no PAC
seria revigorar as agências reguladoras, o que atrairia o investimento privado -hoje temeroso de mudanças
de regras pelo ministro da vez- para
a área de infra-estrutura.
Uma maior participação do setor
privado aumentaria a eficiência dos
investimentos e economizaria recursos públicos. Para o caso dos investimentos com baixo retorno privado,
mas alto retorno social, o governo poderia entrar subsidiando uma parte
(idéia das PPPs), mas, de novo, não há
necessidade de que o Estado seja o
empreendedor dos projetos.
O ponto mais incômodo do PAC é,
porém, a redução do superávit primário que ele enseja. Ao contrário do argumentado pelos autodenominados
desenvolvimentistas, a evidência internacional mostra de modo cabal
que superávits primários elevados em
países com endividamento alto, como
é o nosso caso, não atrapalham o crescimento. Muito pelo contrário, quando o governo economiza recursos e
com eles recompra sua dívida mais
rapidamente, o risco fiscal cai e, com
ele, os juros reais de longo prazo. Juros reais de longo prazo menores tornam mais atraentes os investimentos,
inclusive em infra-estrutura.
Em resumo, a necessidade premente de melhorar nossa infra-estrutura
para crescermos mais celeremente
não deveria ser enfrentada com mais
Estado, mas, sim, com mais setor privado. Manutenção de superávits primários na casa dos 4,5% e fortalecimento das agências reguladoras assegurariam a vinda desses recursos.
CARLOS EDUARDO SOARES GONÇALVES, doutor em
economia, é professor de macroeconomia e vice-coordenador do programa de pós-graduação da Faculdade de
Economia e Administração da USP.
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