São Paulo, sábado, 27 de janeiro de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) representa uma inovação na política econômica?

NÃO

Um remendo chamado PAC

CARLOS EDUARDO SOARES GONÇALVES

DEPOIS DE muitas idas e vindas, o governo finalmente divulgou nesta semana o tão alardeado pacote econômico que, segundo seus progenitores, irá tirar o Brasil do marasmo do crescimento que nos acompanha há mais de duas décadas. É de fato bastante incômoda essa posição de retardatário do crescimento mundial, mormente em período tão favorável para as economias em desenvolvimento. Infelizmente, porém, não será o PAC que dela nos livrará.
Antes de dizer por que o PAC é insuficiente para destravar a economia brasileira, é preciso identificar as causas do baixo crescimento, que são, em grande medida, estruturais, e não conjunturais. Demandam, pois, reformas, e não pacotes simplistas recheados de marketing.
A pesquisa empírica revela que nosso pífio crescimento se deve a um conjunto de fatores que o PAC só tangencia, incluindo: baixo nível educacional da força de trabalho; péssimo clima para negócios; infra-estrutura em estado calamitoso; gastos públicos correntes em patamar elevadíssimo; carga de impostos alta e estrutura tributária ineficiente; tênue garantia dos direitos de propriedade; e proteção tarifária ainda elevada. Por limitação de espaço, focaremos em alguns desses verdadeiros gargalos e na sua relação (ou ausência de) com o PAC.
O pacote consiste, grosso modo, em algumas reduções de impostos para setores selecionados (que suscita uma "escolha de vencedores" por burocratas em Brasília) e em um aumento do investimento público, com ênfase para a infra-estrutura.
Vale dizer que, em certa medida, o diagnóstico do governo -é preciso reduzir impostos e melhorar o estado da infra-estrutura- é correto. Errado é o remédio proposto: escolher vencedores e aumentar os gastos públicos reduzindo o superávit primário.
Já no que tange à contenção das despesas correntes, um dos maiores entraves ao crescimento, pelos seus efeitos perversos sobre os juros e a carga de impostos, apenas uma proposta minguada de diminuição da taxa de crescimento dos gastos reais com os servidores públicos. É muito pouco para um país em que o setor público deveria gastar, dada a nossa renda per capita, na faixa de 20% a 25% do PIB, e não 33%.
Investimentos em infra-estrutura são mais que urgentes, sobretudo nas áreas de transporte e energia. Estudos empíricos mostram que cerca de 30% da diferença entre nosso PIB e o da Coréia se deve à diferença de infra-estrutura. Mais: investimentos em infra-estrutura são fontes geradoras, "causais", no linguajar dos economistas, de outros tipos de investimento.
Mas isso não significa que o Estado seja o agente mais apropriado para fechar essa lacuna. Uma solução mais inteligente que a apresentada no PAC seria revigorar as agências reguladoras, o que atrairia o investimento privado -hoje temeroso de mudanças de regras pelo ministro da vez- para a área de infra-estrutura.
Uma maior participação do setor privado aumentaria a eficiência dos investimentos e economizaria recursos públicos. Para o caso dos investimentos com baixo retorno privado, mas alto retorno social, o governo poderia entrar subsidiando uma parte (idéia das PPPs), mas, de novo, não há necessidade de que o Estado seja o empreendedor dos projetos.
O ponto mais incômodo do PAC é, porém, a redução do superávit primário que ele enseja. Ao contrário do argumentado pelos autodenominados desenvolvimentistas, a evidência internacional mostra de modo cabal que superávits primários elevados em países com endividamento alto, como é o nosso caso, não atrapalham o crescimento. Muito pelo contrário, quando o governo economiza recursos e com eles recompra sua dívida mais rapidamente, o risco fiscal cai e, com ele, os juros reais de longo prazo. Juros reais de longo prazo menores tornam mais atraentes os investimentos, inclusive em infra-estrutura.
Em resumo, a necessidade premente de melhorar nossa infra-estrutura para crescermos mais celeremente não deveria ser enfrentada com mais Estado, mas, sim, com mais setor privado. Manutenção de superávits primários na casa dos 4,5% e fortalecimento das agências reguladoras assegurariam a vinda desses recursos.


CARLOS EDUARDO SOARES GONÇALVES, doutor em economia, é professor de macroeconomia e vice-coordenador do programa de pós-graduação da Faculdade de Economia e Administração da USP.

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