São Paulo, quarta-feira, 27 de fevereiro de 2002

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ANTONIO DELFIM NETTO

Juro real

No mês de dezembro de 2000, o Copom do Banco Central fez uma vigorosa redução da taxa de juro Selic de 16,5% para 15,75%. A meta inflacionária para 2001 era de 4%. O Relatório de Inflação de dezembro de 2000 confirmou a confiança na sua realização com a projeção da taxa de inflação no fim de ano entre 3,6% e 4,5% (ponto médio de 3,9%). Com a mesma taxa de 15,75%, a projeção da taxa de crescimento real do PIB era de aproximadamente 4,5%. A convicção do governo era tanta que os seus marqueteiros inventaram um formidável slogan: "É a primeira vez, em 45 anos, que a taxa de inflação será menor do que a de crescimento" -como se isso significasse alguma coisa. Quando descobriram que a Argentina (quebradinha "da Silva") cumpria isso havia dois anos, recolheram a viola...
Em janeiro de 2001, o Copom reduziu de novo a taxa de juro para 15,25%, mesmo quando o IPCA sofria um choque transitório de oferta agrícola. A partir de março, o Copom aumentou mensalmente o juro, reconhecendo uma desagradável elevação da taxa anual de inflação de perto de 6% para 7%. Em junho, diante do choque energético, tivemos um aumento do juro de 150 pontos. O ciclo completou-se em julho, com mais 50 pontos, atingindo o nível de 19%, mantido constante por seis meses e, agora, reduzido a 18,75%. Navegando num mar difícil -de choques de oferta, de incompetência governamental na área energética, de enorme flutuação cambial e de incertezas com relação à Argentina e à economia americana-, o Banco Central manobrou com 375 pontos de aumento de juro (de 15,25% em janeiro para 19% em julho). Enquanto isso, o crescimento do PIB afundava.
O resumo de 2001 está na tabela abaixo.

É evidente que as consequências mais danosas para a sociedade brasileira advieram da tremenda redução do crescimento esperado, que tinha boas chances de realizar-se não fosse a barbeiragem energética. A taxa de juro real em janeiro, supondo a "meta" realizada, era de 10,8% (15,25% de Selic e 4% de inflação). Em julho, ela seria de 18% ("swap" de 360 dias em torno de 26% e inflação de 7%). É evidente que os choques de 2001 não se repetirão, mas mesmo os mais otimistas não crêem numa taxa de inflação em dezembro de 2002 muito diferente de 5%, o que dá a elevada taxa de juro real hoje de 14% ("swap" de 360 dias em torno de 20%).
O problema do Banco Central é que 2000 terminou com uma taxa de inflação rodando em torno de 6%, e a meta para 2001 era de 4%. Em 2001, ela terminou em torno de 7,7%, e a meta para 2002 é de 3,5%. A diferença do ajuste da taxa de inflação anual era de 2% (6% menos 4%) em 2001 e será de 4,2% (7,7% menos 3,5%) em 2002. Isso exigirá uma calibração cuidadosa da taxa de juro real se a meta de inflação (e não o seu limite superior) for, como deve ser, seriamente perseguida.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

dep.delfimnetto@camara.gov.br



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